É senso comum afirmarmos que a tecnologia ocupa boa parte do cotidiano de nossas vidas. A troca de informações, interações entre pessoas, comércio e também as relações de trabalho vêm se utilizando cada vez mais das formas tecnológicas.
No meio desse boom de tecnologia, dados e informações são amplamente utilizados como verdadeiro ativo para que plataformas, programas, sites, aplicativos e inclusive ações governamentais funcionem. Contudo, não são poucos os incidentes que envolvem o vazamento de dados, prejudicando gravemente os usuários.
É dentro desse contexto que se debate sobre a proteção de dados pessoais como forma de proteger os direitos e evitar graves danos que possam ocorrer com o tratamento informatizado de dados pessoais. Esse é o propósito da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.
De acordo com o autor Araújo, os impactos da LGPD no Brasil, especialmente na adequação de empresas para o tratamento legal conforme a legislação, bem como nas atividades para as quais o uso de tecnologia é imprescindível, principalmente com grande banco de dados de clientes e também de trabalhadores.
A Lei n. 13.709/18 é a legislação brasileira que protege os dados tanto nos meios digitais como nos meios físicos. Trata-se, essencialmente, de legislação aplicável ao tratamento de dados pessoais realizados no Brasil, cuja finalidade da atividade de tratamento seja a oferta ou o fornecimento de bens ou serviços ou mesmo por operações com dados de indivíduos localizados no Brasil, que podem ser utilizados por pessoa física ou jurídica.
Basicamente, qualquer situação que necessite do fornecimento ou coleta de algum dado pessoal, deve ser adequada à LGPD. Essa adequação engloba diversas atividades do cotidiano de qualquer pessoa: cadastramento no banco de clientes de uma loja, cadastramento em sites para receber promoções exclusivas, publicidade direcionada em redes sociais, bem como as relações de trabalho, conforme ao que escreve Araújo.
No âmbito das relações de trabalho, diversos são os pontos de ligação entre as atividades realizadas e as necessidades de observância da LGPD, tanto na etapa pré-contratual, como durante e após o termino da relação de trabalho. Vale lembrar que a adequação à lei deve ocorrer pela pessoa jurídica e também pela pessoa física que contrata mão de obra, como, por exemplo, os profissionais liberais, por expressa determinação legal.
Qualquer dado pessoal deve constar de uma base legal para tratamento, ou seja, as hipóteses do artigo 7º onde a lei permite que se possa utilizá-lo de alguma forma.
Pensemos em um exemplo: uma empresa está contratando pessoas para assumir uma vaga de atendente e recebe 50 currículos para concorrer, selecionando, ao final, apenas uma para ocupar a vaga. A preocupação no tratamento de dados pessoais não deve apenas se limitar à pessoa que foi empregada, mas, também, aos dados dos outros 49 concorrentes, uma vez que nos currículos existem diversas informações que são protegidas por lei (nome, escolaridade, raça, gênero, CPF, entre outros) e devem ser devidamente tratadas, ou seja, previsão de tempo de armazenamento e formas de exclusão dos dados, por exemplo.
Já no âmbito de uma relação de trabalho iniciada, devemos ter atenção ao contrato de trabalho, que deverá prever expressamente que os dados pessoais daquele trabalhador serão tratados, inclusive mencionando as bases legais, garantindo-se que o trabalhador tenha efetivo conhecimento sobre as operações e as suas finalidades.
Podemos exemplificar com as exigências de avaliação médica para integridade física do trabalhador. Tratando-se de informação sensível, uma vez que se refere a dados sobre a saúde da pessoa, é preciso observar, além das bases legais do artigo 7º, as previsões do artigo 11, pois se tratam de dados pessoais sensíveis. Nesse sentido, a avaliação médica não deve ser utilizada para fins diversos que não atestar a integridade do trabalhador e sem o consentimento do empregado.
Assim, podemos perceber que a LGPD se aplica em diversos momentos da relação de trabalho que, se não observadas, podem ocasionar a responsabilização da empresa por eventuais danos ao trabalhador e até mesmo na aplicação de multa pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados. Para tanto, diversos cuidados são necessários.
Quando falamos da aplicação da Lei Geral nas relações de trabalho é importante termos alguns pontos de atenção. O primeiro deles é verificar se a empresa possui, de fato, um programa efetivo de implementação que atenda ao que a LGPD prevê, isto é, delimitar quais as bases legais, o tempo de duração do tratamento, entre outros, que nada mais são do que os programas de governança previstos no artigo 46.
No âmbito da relação de trabalho, as bases legais que mais podem se amoldar são o consentimento e o cumprimento de obrigação legal, previstas nos incisos I e II do artigo 7º.
Lembremos que a Lei deve ser observada não apenas no momento da contratação, quando o empregado deve estar ciente do tratamento de dados e de suas formas, mas, também, durante todas as atividades que necessitem de dados pessoais, sendo que eventual outra base legal aplicável deve ser informada ao trabalhador, conforme afirma o autor Araújo.
Além disso, é preciso que tenhamos atenção com os princípios, em especial destaque aos princípios da finalidade, adequação, necessidade, não discriminação e transparência, assim conceituados no artigo 6º.
Verifica-se que tais princípios servem não apenas como diretrizes fundamentais da LGPD, mas como balizas interpretativas das situações práticas. Ou seja, no âmbito das relações trabalhistas é preciso que as finalidades do tratamento estejam claras e adequadas para os propósitos pretendidos, bem como que o tratamento se utilize do mínimo de dados possível, sem finalidade discriminatória, com informações acessíveis a seus titulares.
Vimos, portanto, que as previsões da LGPD em muito vem impactando as relações de trabalho, na medida em que fixa parâmetros mínimos para uso, coleta e armazenamento de dados dos trabalhadores, atendendo, sobretudo, às necessidades de proteção aos direitos básicos, especialmente diante da implementação de novas tecnologias na sociedade.
Importante destacar que cada situação deve ser analisada pontualmente para que se possa encontrar a melhor solução e compatibilização da lei com as atividades exercidas. Assim, para além dos impactos e medidas necessárias, é preciso considerar que uma governança e boas práticas em relação a dados pessoais constitui ponto de segurança da empresa e também do trabalhador no âmbito de uma sociedade tecnológica.
Vilson Farias Lais Lindemann
Doutor em Direito Civil e Penal, e escritor Bacharel em Direito
Referências Bibliográficas:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm
https://www.jusbrasil.com.br/topicos/200399417/artigo-7-da-lei-n-13709-de-14-de-agosto-de-2018
https://www.conjur.com.br/2021-fev-11/pratica-trabalhista-impactos-lgpd-relacoes-trabalho
https://www.gov.br/esporte/pt-br/acesso-a-informacao/lgpd
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/como-a-lei-geral-de-protecao-de-dados-impacta-os-contratos-de-trabalho/1178005000
ARAÚJO, Leandro Sampaio Correa de. Impactos da Lei Geral de Proteção de Dados nas relações de trabalho Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-mar-14/ leandro-araujo-impactos-lgpd-relacoes-trabalho.