O julgamento da ADPF 779 sobre a tese da legítima defesa da honra

Vilson Farias. (Foto: Divulgação)

Acerca da medida cautelar ADPF 779 MC-Ref, a respeito da tese sobre a legítima defesa da honra para afastar a ilicitude do feminicídio ou agressão praticada contra a esposa ou companheira adúltera concedendo o perdão judicial ao autor, julgada pelo STF, foi determinada inconstitucional por atacar direitos e princípios constitucionais.

Na situação concreta o Partido Democrático Trabalhista (PDT) ajuizou a ADPF solicitando ao STF que conferisse interpretação conforme a Constituição ao art.23, II e art.25, do CP ao art. 65 do CPP para se manifestar que não é juridicamente possível invocar a tese de legítima defesa da honra. O partido afirmou que a tese viola o art. 1º, III, o art. 3º, IV, e o art. 5º, LIV, da Constituição Federal, que disciplina:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(…)

III – a dignidade da pessoa humana;

(…)

  

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

(…)

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(…)

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

(…)

(CF/88)

 A legítima defesa se entende quando uma vítima utilizando moderadamente dos meios necessários repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. Com isso dá para afirmar que para configurar este instituto que exclui a ilicitude de um fato típico é necessária a soma dos elementos (a) injusta agressão atual ou iminente; (b) proteção a direito próprio ou de terceiro; (c) uso moderado dos meios para repelir essa agressão, não sendo admitidos excessos; e (d) o animus defendendi. Com isso, fica claro que no caso da tese não fica caracterizado a legítima defesa, sendo a legítima defesa da honra um argumento extrajurídico sem respaldo, que busca justificar e desconsiderar um ato ilícito grave como um modo de defesa a uma agressão que não se configurou.

Trata-se de um instituto muito recorrente nos Tribunais do Júri em julgamentos de feminicídios onde aquele que pratica o crime recorre que o adultério da esposa ou companheira justifica o ato, porque na verdade está a se defender, retirando, assim a antijuricidade do fato típico. Evidente que o argumento não está apto para exonerar o agente que comete tais transgressões e por consequência perpetua tal comportamento. Além de ser totalmente discriminatória, pois coloca a mulher em posição subordinada ao homem com sua dignidade e autodeterminação restrita.

Dessa forma o STF proferiu no seu informativo 1009/2021, que a tese da ADPF é inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero. Que a legítima defesa deve ser interpretada tal como se disciplina, excluindo a utilização da legitima defesa da honra no âmbito do instituto da legitima defesa. E, por último determinou que a defesa, a acusação, a autoridade policial e o juízo são proibidos de utilizar, direta ou indiretamente, a tese de legítima defesa da honra (ou qualquer argumento que induza a tese) nas fases pré processual ou processual penais, bem como durante julgamento perante o Tribunal do júri, sob pena de nulidade do julgamento

Referências Bibliográfica:

BRASIL. do Constituição da República Federativa Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em: 20/07/2021

Informativo Edição 1009/2021. 2021. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/informativoSTF/anexo/Informativo_PDF/Informativo_stf_1009.pdf Acesso em: 20/07/2021

CAVALCANTE, Márcio André Lopes.  Dizer o Direito, 2021. Disponível em:  https://tecnoblog.net/247956/referencia-site-abnt-artigos/ Acesso em 20/07/2021

Vilson Farias  – Doutor em Direito e escritor                                                                     

Natália Corrêa – Bacharel em Direito

 

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