A estrutura das famílias brasileiras vem mudando ao longo do tempo, talvez
não pela situação, antes omissa, mas pelo fato de que os relacionamentos
extraconjugais estão sendo assumidos de forma pública, contínua e duradoura
(características de uma união estável).
Diante desse fato, o direito brasileiro aos poucos vem flexibilizando o princípio
da monogamia e concedendo direitos a outros núcleos familiares.
Ainda não existe uma uniformidade de entendimento sobre os efeitos jurídicos
das uniões poliafetivas, há posições que aceitam a divisão do patrimônio entre
os casais em igualdade, levando em conta o tempo da convivência. Há quem
entenda que a primeira união tem primazia sobre as demais, por ser
equiparada ao casamento.
Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu recentemente, que
amante não tem direito de dividir pensão com viúva. O processo (RE 1045273),
que teve origem em Sergipe, envolve o reconhecimento de uma união estável e
uma relação homoafetiva concomitantes. A tramitação ocorre em segredo de
Justiça. O Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) e a Associação
de Direito da Família e das Sucessões (ADFAS) participam como amicus
curiae (parte interessada).
Já o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) atendeu parcialmente o
pedido de uma mulher, reconhecendo uma união estável concomitante ao
casamento, deferindo o seu pedido de parte do patrimônio de um homem com
quem manteve relacionamento por 14 anos.
Há muita polêmica e divergência de opinião em relação ao assunto. Discute-se
ainda o impacto que uma decisão favorável do Supremo teria sobre as contas
da Previdência Social. Isso pela possibilidade de o benefício se prolongar no
tempo, já que a pensão não se encerraria com a morte de uma das
beneficiárias.
O Supremo Tribunal Federal já enfrentou esse tema. No ano de 2008, a 1ª
Turma decidiu, por maioria, que não poderia haver a divisão da pensão entre
amante e cônjuge (RE 397762). Com base no precedente, o relator da nova
ação, ministro Alexandre de Moraes, negou o pedido. Segundo Moraes, o STF
já julgou o tema e vedou o reconhecimento de uma segunda união estável –
independentemente de ser hétero ou homoafetiva – quando demonstrada a
existência de uma primeira união estável juridicamente reconhecida.
Para Fachin, a pensão por morte deveria ser dividida no caso concreto. “Uma
vez não comprovado que ambos os companheiros concomitantes do segurado
instituidor, na hipótese dos autos, estavam de má-fé, ou seja, ignoravam a
concomitância das relações de união estável por ele travadas, deve ser
reconhecida a proteção jurídica para os efeitos previdenciários decorrentes”,
afirmou.
O relator sugeriu a seguinte tese: “A preexistência de casamento ou de união
estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1723, §1º do
Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo
período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do
dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional
brasileiro”.
É difícil para o direito brasileiro evoluir nesse sentido, visto que o tema é
carregado de preconceito, não se consegue avaliar o tema do ponto jurídico
sem julgar a relação entre as partes, portanto trata-se de um grande desafio a
ser enfrentado pelo judiciário, tanto pelo óbice emocional como por todos os
outros institutos envolvidos.
Referências
https://valorinveste.globo.com/objetivo/organize-as-contas/noticia/2020/12/14/stf-
decide-que-amante-no-tem-direito-penso-por-morte.ghtml
https://www.direitonews.com.br/2020/01/relacao-extraconjugal-amante-heranca-
familia-direito.html
Vilson Farias – Doutor em Direito.
Cíntia Vicente – Advogada.