Inicialmente, sabe-se que a acepção, aplicabilidade punitiva e até mesmo o entendimento no caso concreto sobre os crimes aduaneiros vem repercutindo e se propagando na coletividade por intermédio midiático. Contudo, na maioria dos casos, existem dúvidas técnicas e conceituais se o ocorrido refere-se ao crime de descaminho, conforme disposto no art.334 do Código Penal, ou ao crime de contrabando, tipificado no art.334-A.
Apesar das similaridades existentes entre os dois tipos penais, foi com a entrada em vigor da Lei 13.008/14 que a prévia compilação dessas infrações no mesmo dispositivo penal foi desfeita. Dessa forma, com essa separação, o fator de identificação imediata de suas particularidades se deu a partir do reconhecimento do conteúdo extraviado nas fronteiras e suas devidas declarações fiscais.
Enquanto a infração de descaminho é descrita pela ludibriação total ou parcial do pagamento do imposto concernente à mercadoria apreendida, o contrabando, por sua vez, possui sua disposição alicerçada na introdução ou extração de produtos absolutamente restritos na legislação, ou seja, que são ilegais no território brasileiro e que violam, assim, o controle aduaneiro.
Independentemente das semelhanças relativas à sua descrição e das possíveis confusões, especialmente após o seu destrinchamento em dois crimes distintos, suas cominações de pena também divergem entre si. À medida que o descaminho prevê reclusão de 1 a 4 anos, o contrabando, não obstante, estabelece reclusão de 2 a 5 anos. Já no que diz respeito à competência de julgamento, a Súmula 151 do Superior Tribunal de Justiça trata da temática com a seguinte declaração:
Súmula 151, STJ – A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando ou descaminho define-se pela prevenção do juízo federal do lugar da apreensão dos bens.
Nesse sentido, a Receita Federal é um dos principais agentes no que tange o reconhecimento da ocorrência de tais atos delituosos, bem como a orientação dos procedimentos subsequentes e o combate à esses para a proteção transfronteiriça e funcionamento efetivo do comércio exterior. Mais especificamente, a elementar fiscalização é de incumbência dos peritos credenciados – previsto no Regulamento Aduaneiro no art.813, III -. Dentre suas funções, inclui-se não só a qualificação como também a quantificação dos artefatos prestes a serem importados ou exportados.
Para uma análise mais palpável, no dia 23 de janeiro de 2025, a Polícia Federal, em conjunto com a Receita Federal e a Polícia Militar do Piauí, desencadeou a Operação Conexão Cajueiro, visando desunir organização criminosa com abrangência internacional que foi formada a fim de integrar mercadorias de proveniência estrangeira ao limites nacionais através de portos clandestinos na localidade de Cajueiro da Praia/PI. Nesse caso, foi determinada a apreensão de bens e valores de quantia superior a 250 milhões, aproximadamente. A resolução se deu em razão de todo um trabalho concluído preliminarmente com a apuração do homicídio de um dos líderes dessa organização que, além disso, comandava o descarregamento das embarcações. Com o decorrer da investigação, foi detectado o transporte de cigarros, cuja venda é proibida no país, demais produtos com indícios de falsificação e fuzis sem numeração de série. Os acusados poderão responder não só por lavagem de dinheiro e crime de organização perigosa, como contrabando e descaminho de forma conjunta.
A inspeção frequente desses eventos contra a Administração Pública auxilia na tutela de bens jurídicos fundamentais como a saúde, a ordem pública, e até mesmo a indústria nacional pelo zelo das barreiras alfandegárias. Essa proteção aduaneira garante a soberania nacional ao permitir unicamente a entrada daquilo que é permitido por lei, contribuindo significativamente na regulação econômica, mantendo um harmonioso e lícito ambiente de negócios.
Vilson Farias
Doutor em Direito Penal e Civil, e escritor
Maria Fernanda Rinaldi
Acadêmica de Direito