As previsões dos especialistas em saúde pública começam a se confirmar. Para quem assistia de longe o aparecimento de casos do coronavírus, achando que era apenas mais uma gripe e que os avisos eram exagerados – já que não havia um grande número de mortes, agora começa a ficar preocupado. Afinal, na região, o número de infectados passou de mil e os mortos de 30. E também confirma o alerta de que, depois de chegar ao centro e regiões nobres das cidades, agora começa a percorrer vilas e condomínios nas periferias.
Amiga que está em isolamento social com o filho tem bom relacionamento com vizinhos do prédio. Lembrou que muitos moradores tinham, em outros invernos, problemas com gripe, precisando de atendimento emergencial. Este ano, no condomínio onde mora, cinco casos foram confirmados com coronavírus. Coincidentemente, um deles, de pessoa que achava exagero a reclusão, dizendo que não daria em nada. Precisou ser levada para uma unidade médica e foi enviada para casa; quatro horas depois necessitou de internação, sem retorno.
Conhecido contou o caso do garoto (na casa dos 20 anos), seu parente, que trabalha há poucos anos. Começou como estagiário numa instituição e, depois, foi contratado para atendimento. Simpático e desenvolto, estava acertado que a partir desta segunda trabalharia em casa, auxiliando a parte burocrática. Quinta, como todos os colegas, fez o exame e positivou. Pelos próximos 15 dias fica em quarentena, na esperança de que se recupere, mas deixando pais e irmãos numa forte angústia, comum a todos aqueles que têm alguém infectado.
Inúmeros casos de agentes da saúde que, silenciosamente, trabalham no atendimento e confessam que, no dia a dia, até esquecem do que tratam. Infelizmente, este “esquecimento” tem levado a muitos contágios. Um número crescente e preocupante que propiciou a diminuição de profissionais em condições (muitos estão em grupos de risco), assim como encontrar pessoal para reposição das vagas. Como disse uma técnica em enfermagem: “descuidei, contraí o vírus e foi como se um caminhão tivesse passado sobre meu corpo”.
As portas e janelas da área de circulação do condomínio passaram a ficar abertas, numa situação triste e deprimente; a casa perdeu a alegria do menino que se entretinha muito com a internet, mas também era capaz ajudar nos cuidados de seus irmãos mais novos; a técnica tem medo de ficar próxima do filho pequeno e dos pais com idade avançada. São corações agoniados que podem até terem tido preocupações, mas era tão forte o que amigos, vizinhos e parentes falavam a respeito destas “bobagens” que acabaram descuidados.
Na região, o problema, agora, não é dos outros, mas bem nosso. Tem razão quem diz que, nas vilas e condomínios pobres, é difícil ficar em casa e por este motivo tanta gente zanza pelas ruas dos centros sem necessidade. Não vai ser fácil, mas o menino que, agora, vê a mãe – técnica em enfermagem – apenas pelo celular eternizou na folha de papel a promessa que precisa ser feita por todos, enquanto sociedade: “vai passar, mamãe, e eu ainda vou cuidar bem de você”.