Respeitável público

José Henrique Pires licenciado em Estudos Sociais pelo ICH-UFPel, especialista em Políticas Públicas pela Universidade de Salamanca, Espanha, jornalista e radialista. (Foto: Divulgação)

Tive meus tempos na direção do Theatro Sete de Abril.

E havia, desde sempre, no mais antigo teatro de Pelotas, um papel que poucos percebiam: formação de plateia.

Uma das razões que faziam com que as produções nacionais de teatro, de dança e de música fizessem esforço para que as turnês viessem ao extremo sul do Brasil (iniciando ou encerrando temporadas) era esse patrimônio imaterial pujante que em Pelotas se destacava. Havia uma plateia de qualidade para qualquer tipo de espetáculo e que sabia aplaudir e silenciar na medida certa e na hora correta. Só aplaudiria em pé se o espetáculo fosse realmente arrebatador. Aliás, como os uruguaios e argentinos fazem até hoje.

Ouvi isso incontáveis vezes. Quando encerrado o espetáculo, eu acompanhava a produção e os artistas aos sempre bons restaurantes da cidade.

Também havia sempre uma saudável movimentação na economia, que nem todos percebiam. Os restaurantes procuravam saber quando haveria espetáculo, pois as pessoas gostavam de completar a noitada com um jantar entre amigos para discutir a peça. Os taxistas procuravam saber a mesma coisa para estarem a postos na hora do encerramento da programação. E também me lembro dos salões de beleza querendo saber quando e quem estaria na cidade nos espetáculos, pois quem fosse assistir o que estivesse em cartaz, cortava ou arrumava o cabelo, uma vez que veria e seria visto no entra e sai da atividade artística.

Estamos perto de completar 15 anos de Sete de Abril fechado.

Esse espaço de tempo sem peças infantis, sem concertos de câmara, sem integrar o roteiro de espetáculos que faziam de Curitiba, Porto Alegre e Pelotas, uma rede que diluía despesas de transporte de cenário e equipamentos, permitindo ingressos de custos reduzidos. Isso me preocupa bastante.

Tomara que na reabertura do Sete de Abril, prevista para esse ano, a nova gestão do teatro consiga – mesmo aos poucos – trazer de volta programas como o Sete ao Entardecer, que lotava a plateia, sempre sem cobrança de ingressos, apresentando os melhores músicos da cidade. Mesmo que troquem o nome do projeto e façam a mesmíssima coisa (como já foi feito – durante um tempo foi 277 – segunda às 7 no 7), mas democratizando o acesso e também formando plateia. É um desafio, mas creio que seja possível recriar aquele ambiente favorável, embora não seja tarefa que se execute da noite para o dia.

Os jornais do Rio e São Paulo já reclamam do comportamento de alguns públicos de lá, que não raramente assistem espetáculos, às vezes péssimos, e loucos para ir embora da sala de apresentação, levantam e incorretamente aplaudem em pé para ganhar tempo, dando aos ruins a ideia de que são bons e detonando a qualidade do conjunto, misturando alhos com bugalhos.

Numa plateia pelotense de 15 anos atrás, isso não aconteceria.

Que reabra o Theatro Sete de Abril, merecedor de tratamento muito especial. Afinal, ele é o único espaço público de qualidade que a municipalidade dispõe para apresentações artísticas. Ao mesmo tempo, é um monumento histórico nacional.

É como se a cidade fosse dona de um único violino sob sua administração, que tivesse que ser compartilhado por todos. E esse violino fosse um Stradivarius.

O Sete de Abril é exatamente isso, o Stradivarius dentre os teatros brasileiros e que tem de estar pronto para tocar o mais rápido possível.

Que não nos falte sorte!

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