O inventário das eleições e o espólio que o pleito deixou – parte I

Sérgio Corrêa, jornalista e radialista.

Para escrever sobre os resultados das eleições em Pelotas e região, faz-se necessário contextualizar fatos, apoios e movimentos políticos materializados nos últimos 20 anos.

Sorte, habilidade política ou as duas coisas?

Para afirmar, reconhecer e supor que o político Eduardo Leite (PSDB), além das habilidades políticas, conta também com uma espécie de sorte, é preciso revisitar a história. Em 2004, Leite concorreu, pela primeira vez, ao cargo de vereador e não se elegeu. Contudo, conquistou a suplência e passou a desempenhar cargos de confiança nos governos de Bernardo/Fetter Júnior. Como suplente, contou com a ajuda do então vereador Cururu, que protagonizou um “cerimonial de exorcismo” no plenário da Câmara. Crítico dos colegas e defensor do cartão ponto para vereadores, dentre outras ideias, Cururu apareceu vestindo uma espécie de túnica branca, usando um crucifixo no peito e uma coroa de espinhos na cabeça, dizendo que iria “libertar todos do mal”.

Aconteceu o quê? Cururu teve o mandato cassado.

Quem assumiu a cadeira de Cururu? Eduardo Leite.

Em 2008, Leite se reelegeu vereador. No início daquela legislatura, os partidos já haviam definido quem assumiria a presidência da Câmara de 2009 até 2012. Com sua habilidade política e com a ajuda do então vereador Pedro Godinho (a quem Leite retribui até hoje), ambos apoiados por outros vereadores, articularam um novo movimento político que desarticulou o pacto anterior e elegeu Leite presidente da Câmara – cargo que ocupou de 1º de janeiro de 2011 até 1º de janeiro de 2013.

Em 2012, a demora do então prefeito Fetter Júnior na escolha de um nome entre o próprio Eduardo Leite, o vice-prefeito Fabrício Tavares e Eduardo Macluf, levou Leite à decisão de lançar-se candidato a prefeito, tendo como vice Paula Mascarenhas (PSDB). Imbróglios políticos não permitiram que Fetter tivesse êxito com seu candidato, Fabrício Tavares, restando a Fetter apoiar Eduardo Leite, eleito prefeito em 2012.

Já em 2018, na disputa pelo governo do Estado, tanto Eduardo Leite quanto José Ivo Sartori disputaram o apoio de Jair Bolsonaro – a ponto de surgir nomes como “Sartonaro”. Inegavelmente a retórica, a juventude e as afirmações de que colocaria em dia o salário do funcionalismo em 12 meses – promessa que não realizou no tempo prometido – elegeram Leite governador do Rio Grande do Sul.

Em 2022, durante uma tentativa de candidatura à presidência da República, Leite colocou sua aliada, Ana Amélia Lemos, e outros apoiadores no PSD, partido de Kassab – que seria sua segunda opção partidária para concorrer à presidência da República. Sem sucesso na empreitada, retorna ao Estado para concorrer à reeleição. Ele leva o então vice-governador, Delegado Ranolfo, do PTB para o PSDB, e se alia ao MDB, que lhe oferece como vice Gabriel Souza.

No primeiro turno de 2022, perdeu para Onyx Lorenzoni, do PL, e venceu Edegar Pretto, do PT, por uma diferença de pouco mais de 2 mil votos. Em uma disputa apertada, avançou para o segundo turno e, com o apoio do próprio PT e de todos aqueles que não queriam Onyx Lorenzoni e Jair Bolsonaro no Executivo gaúcho, Leite se tornou o primeiro governador reeleito no Rio Grande do Sul. Chegamos à eleição de 2024 e, mais uma vez, o perfeito trânsito de Eduardo Leite entre os partidos que estão no eixo ideológico da direita, centro-direita, centro-esquerda e até aproximando-se da esquerda fica comprovado.

Apesar de estar coligado com o MDB no governo do Estado para a Prefeitura de Porto Alegre, no primeiro turno, Leite apoiou Juliana Brizola, do PDT. No segundo turno, apoiou Sebastião Mello, do MDB, na disputa contra Maria do Rosário, do PT. Em Pelotas, o apoio a Fernando Marroni, do PT, demonstra o distanciamento de Eduardo Leite do discurso do PL e de Bolsonaro – mas não da direita, pois o PSDB venceu em Caxias do Sul, sendo considerado pelos caxienses um partido de direita. Na próxima edição, o “Inventário das eleições e o espólio que o pleito deixou – parte II” vai analisar o apoio da prefeita Paula Mascarenhas, do deputado Daniel Trzeciak (PSDB) e, também, os possíveis motivos pelos quais o PT foi vencedor em São Lourenço do Sul, Pelotas, Rio Grande, Arroio Grande e Bagé, onde, inclusive, o ônibus do presidente Lula foi apedrejado.

1 comentário

  1. Bom dia

    Embora tenha ficado 20 anos fora, tua análise é perfeita e mostra como os partidos não tem ideologia e sim os interesses pessoais. Um comentário é muito pouco para escrever sobre a sua análise que é bem abrangente

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