Nesta edição, é com satisfação que publicamos o texto enviado pelo senhor Vicente Sacco Netto, leitor da coluna, que, além de acompanhar os conteúdos produzidos e publicados neste espaço de jornalismo, nos prestigia com uma análise do comportamento da sociedade contemporânea materializado no texto a seguir.
O NOVO CANGAÇO
Paradoxos
Nosso país tem certos paradoxos que desafiam o raciocínio do mais indiferente ou alienado cidadão. De uns tempos para cá, verdadeiros atos de terrorismo vêm ocorrendo, principalmente, nas pequenas localidades do interior brasileiro. Tais atos voltados contra as agências bancárias, são denominados de “O NOVO CANGAÇO “. A própria denominação, O Novo Cangaço, tem algo de romântico e até divertido, pois a atividade dos cangaceiros, comandada por Virgulino Ferreira, o lampião, integrou-se ao folclore, ensejando músicas, filmes e outras manifestações populares. Isto já é um paradoxo, pois o banditismo é decantado em prosa e verso. No Novo Cangaço, que inclui armamento pesado e máquinas retroescavadeiras, tratores, caminhões e carros menores, além de explosivos, os prédios das agências – que à noite ficam iluminados e guarnecidos por frágeis portas envidraçadas, expondo os caixas eletrônicos abastecidos de dinheiro – são destruídos. A bandidagem fica à vontade: o dinheiro está ali à disposição, basta que as portas, frágeis como já disse, sejam facilmente removidas e ultrapassadas pelas máquinas e pelos explosivos. Se aparecer alguém, melhor ainda, pois essa pessoa será sequestrada para servir de escudo humano. A grana tomada no assalto pode ser convertida em armas e drogas, realimentando os criminosos para novos “cangaços”. Os atentados da espécie acontecem, principalmente, nas pequenas localidades, cuja população constitui a clientela depositante das agências atacadas. Os bancos parecem não se importar muito com os ataques, pois tudo permanece na mesma, ou seja, sem providências. Será que as seguradoras cobrem as perdas? E se cobrirem, o custo do seguro não é repassado nas tarifas que os depositantes e demais clientes pagam aos bancos? Certamente há reflexos nas taxas de juros cobradas nas operações bancárias. Mas, tenho de me reportar a um paradoxo gigantesco, motivo pelo qual estou abordando este tema: em um passado recente, quando não havia moedas de plástico (cartões de débito e crédito) e, é claro, o PIX, as agências bancárias fechavam suas portas ao final da tarde e ninguém poderia sacar dinheiro depois disso. O dinheiro, ou encaixe, era guardado em cofre que ficava no interior da casa-forte. Os caixas (funcionários) recolhiam também a cota que lhes era fornecida para os trabalhos do dia. As portas do prédio eram hermeticamente trancadas. As chaves do cofre ficavam distribuídas entre dois ou mais funcionários, acontecendo o mesmo com o segredo da porta da casa-forte. Ninguém sacava dinheiro à noite ou na madrugada. Em caso se haver alguma transação financeira nesses períodos, o velho cheque entrava em cena. Nos dias atuais, com os cartões de débito/crédito e com o já consagrado PIX, a circulação de dinheiro em espécie está diminuindo e quase terminando. Pergunto: por que razão as casas bancárias ficam abertas até as primeiras horas da noite e por que ficam iluminadas e desprotegidas durante a madrugada com dinheiro nos terminais de atendimento para aguçar o apetite dos militantes do “Novo Cangaço”? Não conheço ninguém que vá sacar dinheiro nos terminais de autoatendimento em horários da noite ou madrugada.
Portanto, há uma maneira fácil e prática para acabar com o poético, romântico, folclórico e horroroso “Novo Cangaço”: trocar as portas envidraçadas e iluminadas das agências bancárias por outras reforçadas e guardar o dinheiro nos cofres ou casas-fortes.
Vicente Sacco Netto – bancário aposentado e Bel. Ciências Econômicas.