A prisão de Borges de Medeiros em Piratini

José Henrique Pires licenciado em Estudos Sociais pelo ICH-UFPel, especialista em Políticas Públicas pela Universidade de Salamanca, Espanha, jornalista e radialista. (Foto: Divulgação)

O ano era 1932. Getúlio Vargas governava o Brasil desde 1930 e Borges de Medeiros, ainda um respeitado líder. Porém, fora de qualquer governo, decidiu apoiar o grupo paulista que levantou armas contra o governo federal.

Dizem que, de maneira quixotesca, Borges, que era vigiadíssimo em Porto Alegre, onde morava, teria percorrido um bom trecho escondido num tonel de gasolina que circulou na caçamba de uma caminhonete Ford Bigode, assim como o futuro embaixador Batista Luzardo. Tão logo chegaram numa localização segura, saíram montados a cavalo em direção ao centro do Estado.

Foi uma cinematográfica aventura, que os levou à Estância do Cerro Alegre, campos da família Barbosa, de Piratini.

Exatamente no dia 20 de setembro de 1932, naquele local, os 204 aliados borgistas que foram sendo arregimentados e lá faziam sua proteção, enfrentaram 670 homens da Brigada Militar do Estado, num conflito hollywoodiano, com gente entrincheirada, cavalhadas alvoroçadas, fuzis, revólveres e metralhadoras disparando incessantemente dos dois lados.

Ali, morreram 23 combatentes da Brigada Militar – dentre os quais o capitão Catulino, de Dom Pedrito. Dentre os 39 feridos baleados, o tenente Soares Leão, de São Gabriel, e ainda o bravo tenente Serafim, igualmente brigadiano.

Entre os combatentes que guarneciam Borges, morreram três homens, sendo dois de Santana da Boa Vista (José Soares e Altivo Aires) e um peão caseiro da estância, que não tinha nenhuma relação com a refrega, mas foi achado por um balaço vindo sabe-se lá de onde.

Foram seis os Borgistas feridos, dentre os quais o capitão Galdino Fagundes da Rosa e Alberto Severo. Sem munição, sem água e sem fôlego, 45 foram os prisioneiros que saíram de mãos para cima das trincheiras improvisadas.

Vivenciaram ali uma situação delicadíssima. Borges, que estava sendo preso, era um ídolo. Quem governava o Rio Grande do Sul naquele momento era o, até pouco tempo borgista, general Flores da Cunha. Ou seja, apesar do combate sangrento, havia gente amiga dos dois lados da linha de tiro. Havia combatentes brigadianos seguindo ordens do governador de desbaratar aquele grupo insurgente, onde estavam muitos também com origem brigadiana protegendo o antigo chefe naquelas portentosas paredes e mangueiras de pedra, até hoje crivadas de chumbo.

Foram tantas as refregas e revoluções ao longo da história do Rio Grande do Sul que essa tremenda batalha campal – apesar de ser a mais recente, considerando nossos dias – caiu no esquecimento.

O assunto foi bastante estudado, obviamente também muito censurado por tempos, mas rigorosamente documentado.

A estância até mudou de nome. Hoje é Estância do Combate.

Restaurada pelos proprietários na década de 50, as marcas de tiros daquele episódio foram cuidadosamente protegidas, salvaguardando aquele marco histórico dos primeiros e tumultuados tempos do governo de Getúlio Vargas.

Ninguém se atreveu a colocar Borges atrás das grades para cumprir alguma pena. Foi “exilado” no Estado de Pernambuco, fora de seu eixo de influência.

Mas isso é outra longa história, certamente muito interessante.

*José Henrique Medeiros Pires é Licenciado em Estudos Sociais pelo ICH UFPel, Especialista em Políticas Públicas pela Universidade de Salamanca, Espanha e jornalista e radialista

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