Pelotas: Renovado por 90 dias, Decreto da Lei do Sossego segue sendo alvo de questionamentos

Prefeitura afirma que medidas promoveram a redução da pertubação do sossego nas imediações da rua Gonçalves Chaves, próxima a rua Dom Pedro. (Foto: Stéfane Costa/JTR)

Após quase três meses em vigor, desde 21 de agosto, o Decreto 6.766/2023, que regulamentou a Lei 7.199/2023 de Preservação e Garantia do Sossego Público em Pelotas e motivou o movimento Rolê Daora, será renovado, segundo a prefeitura, mas medidas ainda causam diferentes impressões no entorno da rua Gonçalves Chaves.

Entre outros pontos, o texto proíbe, das 00h às 6h, o consumo de bebidas alcoólicas em via pública e a comercialização desses produtos por estabelecimentos comerciais para consumo na área externa pública no quadrilátero composto pelas ruas Félix da Cunha, Almirante Barroso, Gomes Carneiro e Tiradentes.

Para Luciano Oliveira, coproprietário de um dos bares popularmente frequentados pelos jovens na região, o aumento da fiscalização e o horário de funcionamento estipulado pelo decreto não afetaram seu negócio. “A princípio a gente já trabalhava dentro desse horário, até meia-noite. Estava vindo um público que não eram nossos clientes aqui na volta, estava ficando meio perigoso. Para nós, claro que se pudesse esticar uma hora mais, pela questão de ter que fechar meia-noite mesmo, ter que dispersar muito rápido, 1h seria melhor”, diz.

Ele afirma que notou uma diminuição do público na rua, mas que os clientes que costumavam frequentar seu bar ainda mantêm a tradição. “Claro que a rua fica menos movimentada, mas é um público que já não era nosso, o nosso é mais universitário mesmo, então eu acho que para nós não influenciou muito. Claro que pelo movimento deixa de vender uma água, uma cerveja, não vou dizer que não”, completa.

Neste sentido, cita que fatores como o frio e as férias universitárias, que acabam reduzindo o movimento no entorno, impactaram mais do que o Rolê Daora. Mas Oliveira reconhece que para estabelecimentos que não possuem espaço para receber seus clientes a situação é mais complicada.

Este é o caso de João Batista da Silveira, dono de um empreendimento que há 25 anos comercializa bebidas no sistema pegue e leve e relata uma brusca diminuição na clientela. “A noite gera emprego. Eu cheguei a ter oito funcionários em uma ‘safra’ boa, hoje estou com dois, eram quatro com carteira e quatro freelancer, hoje só tem um freela, foi péssimo para o meu negócio. Vai quebrar os comércios, vai deixar de existir a noite, o rolê vai ser da morte, o rolê do extermínio dos comércios”, enfatizou.

Para ele, não apenas os bares e empreendimentos perdem com as medidas mais restritivas. “No meu comércio deu 90% de ‘quebra’. Isso deixou de arrecadar impostos, deixou de gerar imposto, a prefeitura deixou de arrecadar, minhas compras nas firmas caíram 90%”, reforça.

Silveira destaca o horário estipulado pelo decreto como um dos principais problemas. “O meu forte era o pague e leve, as pessoas que vinham pegar para tomar em casa, e depois da meia-noite eu não posso vender bebida alcoólica. O jovem gosta de sair depois das 22h30, 23h, ninguém sai 19h, 20h, até porque muitos estão na faculdade. As pessoas vêm 23h e meia-noite a gente tem que fechar”, explica.

O proprietário de outro empreendimento do perímetro estabelecido pelo decreto, que preferiu não se identificar, falou sobre as dificuldades que vem enfrentando. Ele reconhece que certas situações causam transtorno a quem vive no local, mas não concorda com como as coisas vêm sendo resolvidas. “Eu vejo que há um grande descaso com quem mora aqui na volta. As vítimas são os moradores e os comerciantes, quem mora e quem trabalha. O morador quer dormir, o comerciante tem que trabalhar e ficam uns contra os outros”, diz. Este é outro ponto destacado pelo empresário, a forma com os bloqueios tem sido feitos, deixando os frequentadores das redondezas de fora da calçada e em meio ao trânsito em alguns dias.

Ele ressalta ainda que as mudanças recentes têm afetado as tradições mantidas há anos pelos jovens. “Eles querem elitizar a noite pelotense. Esse esquema de se juntar com os colegas e dividir um litrão [cerveja], cada um dá um pouco, isso está com os dias acabados”, garante. Por fim, ele também questiona a falta de rondas da Guarda Municipal, que fica concentrada em apenas um ponto do perímetro estabelecido pelo decreto.

O secretário de Segurança Pública, José Apodi Dourado, por sua vez, destacou que as operações integradas vêm trabalhando para, além de reduzir os índices de criminalidade no município, proporcionar mais tranquilidade e sossego aos cidadãos.

“Conseguimos reduzir drasticamente a perturbação do sossego nas proximidades da rua Gonçalves Chaves com Dom Pedro II. O projeto Rolê Daora desenvolvido pela Prefeitura de Pelotas foi um sucesso naquele local. Agora com este exemplo, estamos desenvolvendo um estudo para verificar qual a melhor opção de atuação nas avenidas Duque de Caxias e Bento Gonçalves e que, em breve, estará em implementação.

A Lei do Sossego não vai resolver em definitivo o problema de convivência, mas irá amenizar em muito. Precisamos ainda da colaboração da população para que tenhamos maior empatia e uma convivência mais harmoniza”, afirma.

Sobre a realização de patrulhas no entorno da área, o secretário explica ainda que “não há necessidade da viatura ficar rodando, já que ela cumpre o seu papel de sensação de segurança em todo aquele entorno, dados estes confirmados pelo Observatório de Segurança, que indica que quando as viaturas estão no local, não temos quase nenhuma ocorrência de furto ou roubo naquela região”.

De acordo com a comandante da Guarda Municipal Cíntia Aires, as principais alterações a partir do decreto direcionado para a situação da rua Gonçalves Chaves, já dizem respeito ao horário de funcionamento dos estabelecimentos, especialmente nas quartas-feiras. “Em alguns dias não identificados como os mais críticos, se flexibilizou os horários para não ser tão rígido com os estabelecimentos que cumprem o decreto, então podemos avaliar como positivo o efeito e o cumprimento do decreto”, afirma.

Desde seu lançamento, os profissionais da força de segurança envolvidos no programa não precisaram autuar a população presente durante a noite no local e o período tem sido utilizado para orientação.

Enviar comentário

Envie um comentário!
Digite o seu nome