Uma reunião na manha deste domingo (23), no Aeroporto Internacional de Pelotas, debateu a situação da falta de energia na Zona Sul do estado desde a passagem de um ciclone extratropical, entre os dias 12 e 13 deste mês. Durante pouco mais de 1 hora e 30 minutos, prefeitos da Associação dos Municípios da Zona Sul (AZONASUL) expuseram demandas e reclamações ao presidente da CEEE Grupo Equatorial, Raimundo Barretto Bastos e ao governador Eduardo Leite (PSDB). A expectativa é que o serviço seja restabelecido ainda hoje para os cerca de 300 clientes ainda afetados.
A reunião começou a portas fechadas. A justificativa foi que o espaço seria pequeno para acomodar a imprensa. Por isso, o acesso foi limitado à cinco minutos. Na ocasião, os prefeitos puderam expor o descontentamento com a situação. Em uma das manifestações, o chefe do Executivo de Morro Redondo, Rui Brizolara (União) destacou que ainda há de 50 a 100 consumidores sem o serviço no município e criticou a falta de comunicação por parte da empresa, tanto com consumidores quanto com as administrações municipais.
Após a reunião, Brizolara destacou que já havia sido realizada uma reunião no dia 17, em Porto Alegre, que não deu resultado. Neste domingo, ele salientou que houve oportunidade para relatar a falta de comunicação, logística e coordenação pela empresa. “O município poderia ter ajudado a CEEE Equatorial e o problema ter sido resolvido”, sugeriu. Segundo ele, a expectativa é que a resposta para possíveis eventos da mesma natureza seja melhor.
Em Arroio do Padre, moradores realizaram três manifestações ao longo de sábado (22), bloqueando trechos da ERS 737. No município, o prefeito Rui Peter (União) estima que 25% das casas estejam sem energia elétrica. Ele reforça que a reunião com a direção da empresa na capital gaúcha não teve resultado e que as equipes não concluíam os serviços iniciados no município, sendo deslocados para outras cidades. A ausência de energia promove prejuízos no agronegócio. Na cultura leiteira, as perdas foram de 100% ao longo dos últimos dias, devido à dificuldade em resfriar o liquído na temperatura exigida pela legislação e a própria alimentação das pessoas. “As pessoas do interior estocam carne, comida, que é um exemplo, e isso foi totalmente perdido, além de um prejuízo financeiro de quem tem condições de um gerador. Em média, em torno de R$ 100 por dia para pequenos produtores”, explica.
O prefeito do Chuí e presidente da Associação dos Municípios da Zona Sul (Azonasul), Marco Antonio Barbosa (União), explicou que a reunião serviu para cobrar uma solução definitiva da empresa. Ele conta que os municípios possuem um plano de ação em caso de contingência em articulação com outros órgãos e com o estado, o que não ocorre no caso da empresa. “Como é que a Equatorial não está preparada, como é que a Equatorial não tem um plano de contingência, como é que a Equatorial não aceita ajuda dos municípios no caso de uma máquina para tirar uma árvore, uma máquina para fazer o caminhão chegar em um lugar. É isso que nós estamos indignados”, disse.
Ele destaca que em agosto deverá ser realizada uma reunião de uma comissão fiscalizadora da Assembleia Legislativa na região para debater o assunto e que o Ministério Público deverá ser acionado. “Os prefeitos são responsáveis pelos seus atos, os prefeitos respondem à tudo, principalmente na Justiça […] e agora temos uma empresa privada, que comprou uma concessão do estado, não prestando o serviço que tem que fazer neste caso”, reclama.
Ele adianta que ainda durante a semana deverá haver uma reunião virtual para debater uma possível ação coletiva ou individual dos municípios em relação ao ressarcimento de danos aos clientes.
Também participaram os prefeitos de Pedro Osório, Moacir Alves (MDB), o Chola; Rio Grande, Fábio Branco (MDB); Arroio do Padre, Rui Peter (União); Pelotas, Paula Mascarenhas (PSDB); Capão do Leão, Vilmar Schmidt (Progressistas); São Lourenço do Sul, Rudinei Härter (PDT); Cerrito, Douglas Silveira (Progressistas); e Canguçu, Vinícius Pegoraro (MDB), além dos vices-prefeitos de Pinheiro Machado, Ronaldo Moura (PSB), São José do Norte, Neromar Guimarães, e Herval, Celso Silveira. Pedras Altas foi representada pelo secretário-geral de governo, Arildo Madruga e Arroio Grande pelo procurador-geral José Paulo Gomes de Freitas.
Pela empresa, também compareceram o superintendente comercial da distribuidora, Fernando Ortiz, e o gerente executivo de manutenção da Regional Sul, Jorge Modesto.
Resultados
Ao final, o presidente da empresa garantiu que a situação dos clientes que foram afetados pelo ciclone será resolvida ainda neste domingo (23). “Nós identificamos no nosso sistema apenas cerca de 300 clientes, [estamos] com todas as turmas alocadas para encerrar esse assunto”.
Ele afirmou que a reunião foi positiva e que todos os prefeitos tiveram razão nas colocações realizadas. A demora no restabelecimento de alguns pontos, segundo Bastos, ocorre pois há priorização de alguns pontos. No pico, 725 mil clientes ficaram sem o serviço na área de concessão da companhia. Ele afirmou que houve boa perfomance em solucionar o problema para a maior quantidade de clientes possível, mas que em outros pontos houve a necessidade de maior esforço para que a rede fosse reconstituída, citando as cidades de Arambaré e São Lourenço do Sul, nas quais foram registrados 31 e 41 postes caídos, respectivamente. “É reconstruir toda uma rede. E com o número de clientes, comparado com um primeiro momento que o ciclone abalou – que foi um ciclone que se comenta que há 100 anos na região, na área de concessão [..] esse foi o mais violento – gerou uma grande interrupção de forma muito pulverizada”, argumenta.
De acordo com Bastos, a ocorrência de danos em diversos pontos foi uma das principais dificuldades durante o evento climático, mesmo quintuplicando as equipes. Para os próximos eventos, ele projeta que o trabalho deverá ser realizado melhor de forma preventiva. Afirmou ainda que não houve falta de equipamentos, como postes, o que foi relatado por alguns moradores, e que deverá haver a formação de novos profissionais que integrarão o quadro da equipe da distribuidora.
Sobre os danos e prejuízos apontados por moradores, ele afirmou que o tratamento se dará pelos Procons, de forma administrativa, e que seguirão a forma de tratamento de outros casos semelhantes.
“Nós estamos enxergando todos os clientes. só podemos nos desculpar, de fato, de não ter conseguido atender esse número menor de clientes, mas por tanto tempo, e vamos trabalhar para que isso não se repita mais”, disse.
O governador do Estado, Eduardo Leite (PSDB), também conversou com a imprensa. Ele lembrou que a CEEE, quando era estatal, estava com processo de cassação da concessão, situação que foi revertida após a privatização e arremate feito pelo Grupo Equatorial. “Por não cumprir com os parâmetros contratuais, a empresa estava colapsando, não conseguia nem pagar os impostos, não conseguia fazer qualquer investimento”, disse, justificando que a continuidade do serviço pela empresa era “mínima, quase inexistente”.
A situação, segundo ele, faria com que o serviço, de qualquer forma, estivesse sendo executado por uma empresa privada. Ao Estado, segundo ele, agora, cabe o papel de fiscalização, o que é realizado pela Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (AGERGS). Ele pontua que a demora no restabelecimento do serviço em pontos da região não é aceitável. “Por isso, o papel da agência reguladora, acompanhando a performance da companhia, apurar o que aconteceu e até estabelecer, se for o caso, sanções à companhia. E essa sanção pode ser até – não digo que seja o caso para este episódio especificamente,- mas se houver recorrentes problemas, a cassação da concessão”, destaca.
O chefe do Executivo estadual destacou que o propósito da reunião com a presença do presidente da distribuidora e de prefeitos da região foi, justamente de apresentar a gravidade do problema e que garantir que haja providências rápidas quanto à normalização do serviço e preparação para eventos futuros. “Que tomem providências para qualificar as equipes, melhorar a logística, para que nos novos eventos climáticos que vão acontecer a gente não tenha a mesma dificuldade”, afirmou.
Leite destacou ainda que a Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura também deverá acompanhar a situação junto à Agergs e à Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). O chefe do Executivo gaúcho alega que é necessário ter a compreensão de que a empresa herdou redes de distribuição que estavam precarizadas pela falta de investimento. “Agora, dificuldades de atendimento, equipes com treinamento inadequado, dificuldade de comunicação, isso é inaceitável, isso é o mínimo que essa companhia precisa colocar e garantir que esteja sendo atendido à população”.
O que diz a AGERGS
Nenhum representante da AGERGS participou da reunião. Em nota publicada na sexta-feira (21), a agência afirmou que vem monitorando diariamente a situação “cobrando o cumprimento do contrato de concessão pela CEEE-Equatorial e a prestação do serviço adequado à população gaúcha”.
A agência ainda apontou que a continuidade do fornecimento dos serviços prestados pela CEEE Equatorial foi objeto de Plano de Resultados para o período 2021/2022 “que apurou resultados parcialmente satisfatórios, apontando para a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) a necessidade de ação fiscalizadora pela Agência Estadual, aguardando autorização da Agência Nacional desde maio de 2023”.
Com isso, AGERGS declarou que dentro de suas atribuições, emitiu, em agosto de 2022, multa de cerca de R$ 29 milhões, atualmente em recurso na ANEEL.