
A cultura do morango ganha destaque em setembro em Turuçu. O município, que já celebra a Festa do Morango e da Pimenta no último fim de semana de outubro (este ano nos dias 28 e 29), inova agora ao realizar a primeira Abertura da Colheita do Morango. O evento está marcado para o dia 14 na propriedade do idealizador do evento, o produtor Gilvane Harms, de 37 anos, presidente da Associação dos Produtores de Morango do município. A iniciativa é da própria entidade, em parceria com Embrapa Clima Temperado, Emater/RS-Ascar e prefeitura.
A ideia é coroar a trajetória da Associação e a produção de morango em Turuçu, que na safra passada chegou a 400 toneladas a uma produtividade média de 40 toneladas por hectare. Um momento dedicado à comemoração, troca de ideias e mostra de novidades.
Contará com a presença da Corte da 10ª edição da Festa, de associados, autoridades do município, técnicos dos escritórios da Emater/RS-Ascar da região, pesquisadores da Embrapa, ex-presidentes e diretores da Associação de Produtores, que irão relembrar histórias sobre os 21 anos da entidade que hoje congrega 49 famílias, titulares de secretarias ligadas à área rural dos municípios da Zona Sul – enfim, toda a cadeia de produção, políticas públicas, pesquisa e assistência técnica na órbita da produção de morango.
Na programação, visita à lavoura, falas sobre as variedades cultivadas, sobre o trabalho na pesquisa e, claro, degustação – muita degustação das variedades in natura, além de bebidas e quitutes à base de morango produzidas por famílias e agroindústrias.
A ideia surgiu por experiência própria, ao participar de eventos similares de outras culturas. “Por que não fazer a do morango também, por que não mostrar o nosso trabalho e a nossa trajetória”, questionava-se Gilvane Harms. Primeiro propôs para os colegas de associação. Ato contínuo, procurou a Emater no município, que “abraçou a causa”. Depois, prefeitura, que vai disponibilizar a estrutura, e Embrapa. Todos de acordo. Vai acontecer.
“[É] mostrar o que eles fazem, o produtor se dedica totalmente a isso, com ou sem a nossa parceria”, diz Alessandra Storch, coordenadora do escritório da Emater em Turuçu. “Pessoal é diferenciado aqui”, elogia ela. E vai adiante: “Está sempre disponível, é guerreiro, não se entrega, é receptivo à inovação e a tudo que pode ser positivo para a cultura – são bem informados, se formam e não têm medo de errar”.
Não poderia, portanto, ser em outro lugar que não Turuçu para abrir a colheita na região. O município tem história no morango: foi na Colônia Picada Flor a primeira capacitação regional em torno da produção da cultura, quando se instalou a primeira estufa semi-hidropônica. A Colônia Santa Silvana recebeu a primeira estufa com recirculação de água (produção em bancada).
“É um município precursor”, reforça Alessandra, apontando ainda que a fruta também é fornecida para merenda escolar, por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). “É produzida com segurança e acompanhamento, vai para a mesa das crianças, o manejo aqui é muito regulado, de maneira legal, quanto mais natural melhor e temos experimentado isso”, diz ela.
Harms não esconde a ansiedade para realizar o evento. Nesta safra atribui a qualidade da fruta ao clima, com picos de calor, e às mudas, oriundas da Argentina, da Espanha e dos laboratórios da Embrapa, onde são desenvolvidas cultivares. “Trabalhamos para ter qualidade e sabor, que está excelente”, assegura.
O produtor está bem localizado: sua propriedade fica às margens da BR 116, a cinco minutos da zona urbana de Turuçu e a 30 de Pelotas. Vende diretamente para o consumidor, para a Ceasa para o varejo dos dois municípios – um mercado cativo que mantém há vários anos. “Tenho clientes certos. As encomendas começam antes da safra”, afirma.
Além disso, assim como seus pares, conta com apoio da prefeitura de Turuçu para aquisição de mudas via Promorango, o programa municipal de incentivo à cultura que contempla os produtores filiados à Associação. Concede subsídio de 30%, pago somente no ano seguinte, com cerca de oito meses de carência.
Neste cenário, Gilvane Harms não quer outra vida. A se queixar apenas do custo de produção, que não é doce como o morango. “Se manteve igual ao da última safra – médio para alto”.

Morangueiro por tradição
O morango, como não pode deixar de ser, é o carro-chefe da propriedade de 18 hectares em que o presidente da Associação de Produtores de Morango de Turuçu vive com a esposa Suelen e o filho Guilherme, de dez meses. Fica na localidade de Corrientes. Natural da Colônia Palmeira, no limite de Pelotas com Turuçu, diz que esta é uma tradição familiar. Na área, além de morango, cuida da produção de cebola, pimentão e batata doce. Na safra passada colheu quatro mil quilos da fruta, um quilo por planta. Nesta, ampliada para seis mil plantas, acredita que vai colher seis toneladas.
A colheita teve início dia 20 de julho. Com menos horas de frio e picos de calor, foi antecipada em um mês. Conta que as chuvas e a oscilação térmica não trouxeram muitos riscos. “Não tem segredo, o produtor precisa se adaptar ao clima, é simplesmente manejo”, diz.
Além de adubação e tratamento fitossanitário, cobre toda a lavoura com lona de plástico para evitar chuva direta. “[Tem que] olhar todos os dias pra planta. Não pode falhar dois ou três dias. Olhar pra planta, observar, tentar entender, como se fosse filho”, ensina.
Harms defende que todo o investimento na planta dá retorno, o que se traduz em cuidado no manejo, dispor de assistência técnica e estar atento e aberto à inovação e novas tecnologias. Para ele, esta tem sido a fórmula a que recorre para atingir maior produtividade, que atualmente chega a um quilo por planta. Nem sempre foi assim. Há alguns anos, colhia no máximo 700 gramas.

representada pela coordenadora do escritório da Emater, Alessandra Storch. (Foto: Adilson Cruz/JTR)
“A genética permite essa produtividade, mas não sozinha, isolada”, diz a coordenadora da Emater em Turuçu. “Precisa ser bem tratada, a pesquisa e a assistência técnica são importantes, mas o produtor é peça central na engrenagem”, afirma ela. Conforme Alessandra, além do produtor, cada propriedade tem sua especificidade: é preciso descobrir o que é adequado a cada uma.
Mudas e variedades
Argentinas, espanholas, além de variedades de melhoramento genético da Embrapa que estão em testes na propriedade e serão mostradas na abertura da programação do dia 14. Cada variedade tem ciclo de produção diferente. Algumas têm pico em setembro, outras em outubro, o que dá equilíbrio à produção. Estima que este ano vá colher bem até dezembro e “ainda alguma coisa em janeiro”, especula.
Embrapa presente
A presença da Embrapa Clima Temperado na propriedade de Gilvane Harms não se restringe ao evento. Na lavoura do produtor a empresa pública de pesquisa agropecuária mantém uma unidade de observação de melhoramento genético com 500 mudas de variedades ainda inéditas. Não está lá por acaso. O pesquisador Luís Eduardo Antunes concorda com a coordenadora do escritório da Emater em Turuçu: é um município precursor na cultura do morango.
“A Abertura da Colheita é um movimento muito interessante de estímulo ao produtor, põe a fruta e a produção na vitrine”, elogia. Cita também o programa da prefeitura de incentivo à produção, política pública consolidada que se mantém independentemente do prefeito ou do partido que assume a administração, e justifica a importância de levar às propriedades uma unidade como a que se encontra na lavoura de Harms.
“O produtor nos ajuda muito a conhecer as virtudes e os defeitos da cultivar”, explica Antunes. Segundo o pesquisador, unidades similares a instalada na propriedade do produtor turuçuense estão presentes em pomares de morango de agricultores familiares de Pelotas, Santa Catarina e São Paulo, em municípios como Atibaia e Jarinu.
Foram iniciativas como essa que permitiram à Embrapa desenvolver a cultivar Fênix, a ser lançada durante a Expointer, com direito à presença do ministro da Agricultura e Pecuária, (MAPA), Carlos Fávaro, e da presidente da instituição, Silvia Maria Massruhá
Registrada ano passado no MAPA, a cultivar é recomendada para as regiões Sul e Sudeste do país.
Segundo Antunes, está hoje em seis mil hectares – a metade no estado de Minas Gerais. No Rio Grande do Sul ocupa entre 600 e 700 hectares. Recentemente, a Embrapa abriu edital público e 23 viveiros se habilitaram a produzir a variedade. Nove deles no estado – três na Zona Sul. Vantagem: produzida no Brasil, oferece ao produtor mudas mais baratas, diminuindo o custo de produção, e pode ser distribuída em períodos mais adequados ao plantio, como fim do verão e início do outono.
“Hoje só se planta quando chega a muda importada, isso dificulta o planejamento do produtor”, explica o pesquisador da Embrapa Clima Temperado. De acordo com ele, ao plantar mais cedo se tem mais produção, o que se reflete no bolso do produtor. “Ele ganha mais e o mercado em junho já teria morango disponível, de uma planta jovem, de melhor qualidade, que ofereceria um morango mais doce e consistente, ampliando o período da colheita.”
Atualmente, estima-se que 95% das variedades estrangeiras que chegam ao Brasil via importação são desenvolvidas pela Universidade da Califórnia (EUA) e 98% dos produtores compram mudas importadas.