Santas Casas de Rio Grande e São Lourenço do Sul enfrentam grave crise financeira

Apesar de ser um dos maiores complexos hospitalares do interior do Estado, a Santa Casa de Rio Grande apresenta a situação mais crítica entre as instituições de saúde na região. (Foto: Divulgação)

As Santas Casas de Rio Grande e São Lourenço do Sul vêm enfrentando uma crise sistêmica grave que perdura há vários anos. Ambas as instituições de saúde possuem milhões de reais em dívidas acumuladas e déficits mensais, gerando problemas não apenas nos serviços prestados, mas também no pagamento do salário dos corpos médicos. Os profissionais reivindicam a quitação dos valores devidos ou então haverá a rescisão de contratos e demissão coletiva.

A Associação de Caridade Santa Casa de Rio Grande (ACSCRG) é referência em diversas especialidades médicas para mais de 20 municípios da região sul, abrangendo as regiões de saúde 21ª e 22ª. A instituição possui aproximadamente 300 leitos e mais de mil colaboradores, entre multiprofissionais CLT (com benefícios trabalhistas) e médicos PJ (sem benefícios trabalhistas). A ACSCRG é especializada em áreas de alta complexidade, como cardiologia, vascular, neurologia, traumato-ortopedia e oncologia. Também conta com Pronto Socorro 24h, sendo a principal porta de entrada para atendimentos de emergência de média e alta complexidade. Além disso, 86% dos atendimentos são destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Apesar da magnitude, sendo um dos maiores complexos hospitalares do interior do Estado, a Santa Casa de Rio Grande apresenta a situação mais crítica entre as instituições de saúde na região. O hospital apresenta um déficit mensal de cerca de R$ 1,9 milhão e uma dívida acumulada, desde julho de 2022, que ultrapassa R$ 500 milhões. Esse cenário levou à restrição de atendimentos desde o dia 10 de janeiro, devido a uma outra dívida de R$ 7 milhões com cerca de 90 médicos. Atualmente, a instituição de saúde recebe apenas pacientes de urgência e emergência (com risco iminente de vida), primeiras consultas ambulatoriais e cirurgias eletivas (agendadas com antecedência).

A dívida com o corpo médico é outra problemática. Os profissionais estão com os salários atrasados há cinco meses. Frente à situação, foi realizada uma Assembleia Geral Extraordinária do Corpo Clínico, na noite do dia 25 de fevereiro, na qual os profissionais decidiram rescindir os contratos em até 30 dias, caso a situação não seja resolvida.

A proposta apresentada sugere o pagamento de 50% do valor devido em até 15 dias e o restante no prazo de 30 dias após a notificação, cabendo a cada médico decidir individualmente sobre a continuidade da prestação de serviços. A decisão já foi notificada formalmente ao Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) e ao Sindicato dos Médicos de Rio Grande (Simerg).

Em nota nas redes sociais, a administração da Santa Casa de Rio Grande afirma estar “adotando medidas para garantir a manutenção do atendimento, com prioridade para a organização das escalas no Pronto Socorro e nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI’s), evitando qualquer prejuízo à assistência aos pacientes”. Além disso, informa que um plano de contingência será elaborado junto à Secretaria Municipal de Saúde, Conselho Municipal de Saúde e 3º Coordenadoria Regional de Saúde (3ª CRS). “A Direção reconhece a legitimidade do movimento dos médicos e reafirma seu respeito a esses profissionais, cuja dedicação e excelência são fundamentais para o atendimento à comunidade”, concluiu.

Encaminhamentos

O Conselho Municipal de Saúde de Rio Grande aprovou por unanimidade, na segunda-feira (10), o convênio entre o Executivo e a Santa Casa para a manutenção do Pronto Socorro. A Prefeitura repassa R$ 600 mil para o funcionamento de urgência e emergência – valor que não era reajustado desde 2020. Agora, com a aprovação do convênio, o investimento no hospital passa a ser de R$ 747.420,00, valor corrigido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

Além disso, a entidade está em processo de Recuperação Judicial, que permite a reestruturação de dívidas de empresas em dificuldades financeiras. A ACSCRG também tem buscado solucionar a crise financeira a partir da busca pelo aumento da receita na saúde suplementar, redução de custos e revisão de contratos com terceiros.

A pauta da Santa Casa de Rio Grande foi abordada durante uma reunião da Associação dos Municípios da Zona Sul (Azonasul), em Pelotas, no dia 6. Com a participação de deputados, gestores de saúde, direção do hospital e Promotoria da República, as lideranças refletiram sobre a possibilidade de viabilizar o empréstimo de R$ 14 milhões por meio de um Termo de Compromisso entre a Santa Casa, a Portos RS e o Ministério Público (MP). Uma operação semelhante já havia sido realizada em julho de 2022, quando foram disponibilizados R$ 14,4 milhões.

Presente no encontro, representando o MP, a promotora Anelise Becker afirma que o recurso não será liberado até que se apresentem medidas eficazes para o enfrentamento da crise no hospital. “É uma prerrogativa do Ministério Público Federal, que haja contrapartidas dos entes envolvidos para que garantam a manutenção dos serviços, não somente com o pagamento dos honorários em atraso, pois é uma problemática sistêmica. A instituição necessita de um aumento de aporte mensal para viabilizar o funcionamento do hospital”, explicou a assessoria de comunicação da Santa Casa de Rio Grande.

O presidente da Azonasul e prefeito de Pinheiro Machado, Ronaldo Madruga (PP), anunciou também que a proposta da entidade é a instauração de uma auditoria externa para medir os gargalos enfrentados pela instituição, através da construção de um diagnóstico fiel, capaz de estruturar um plano eficiente de recuperação. Outra alternativa discutida seria a possibilidade de aumentar os convênios com os municípios, que fariam um aporte de recursos extras para o atendimento Porta de Entrada às prefeituras conveniadas.

Na quarta-feira (12), começaram a ser pagos parcialmente os honorários atrasados de outubro do ano passado de alguns dos médicos. No entanto, os profissionais seguem com o planejamento de rescisão coletiva para o dia 25 de março. Neste sábado (15), a entidade completa 190 anos.

Santa Casa de São Lourenço do Sul caminha para situação parecida

Caminhando para o mesmo cenário, a Santa Casa de Misericórdia de São Lourenço do Sul também corre risco de paralisação em algumas especialidades. Isso porque o hospital está com um déficit de R$ 900 mil mensais e dívidas que somam R$ 178 milhões. Além disso, os honorários médicos da entidade também estão atrasados, levando os profissionais a decidirem, por unanimidade, pela paralisação dos atendimentos eletivos desde segunda-
feira (10).

Além da suspensão desses atendimentos, a categoria estabeleceu um prazo de 15 dias para que a Santa Casa quite integralmente os valores. Caso o pagamento não ocorra até 25 de março, a instituição de saúde deverá considerar rescindidos os contratos médicos. O grupo também rejeitou propostas de novo parcelamento dos salários atrasados. O Simers afirma que a medida é uma resposta a esta situação que se arrasta há anos.

A situação do hospital também foi abordada durante a reunião da Azonasul. Ficou definido no encontro que a 3ª CRS receberá um documento detalhando as especialidades que correm o risco de paralisação, enquanto o MP propôs um diálogo de aproximação com os municípios da região para buscar resolver a problemática.

No mesmo caminho, a Santa Casa de São Lourenço do Sul está com os atendimentos eletivos suspensos desde segunda-feira (10). (Foto: Tatiane Klumb/JTR)

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