Quebra na safra da soja reforça prejuízos milionários na Zona Sul

Até metade de janeiro, cerca de 15% de um total de 503.063 hectares de área plantada estavam comprometidos de modo irreversível na região. (Foto: Adilson Cruz/JTR)

As perdas na safra da soja devido à estiagem reforçam um prejuízo milionário na Zona Sul do estado. Segundo o gerente regional da Emater/RS-Ascar, Ronaldo Maciel, os prejuízos estão estimados em R$ 747 milhões na economia da região.

Até metade de janeiro, diante do déficit de chuvas que se registra desde a primavera nos 22 municípios de abrangência do Corede Sul, pelo menos 15% de um total de 503.063 hectares de área plantada estavam comprometidos de modo irreversível na região.
A perda, milionária, inclui outras culturas. A soja, principal cultivo da Zona Sul, não é a única a sofrer com a estiagem. Lavouras de milho, abóbora e feijão, além da produção de leite e de bovinos de corte, também são castigados pelo déficit pluviométrico que começou a se formar em outubro do ano passado.

Até 18 de janeiro, o Escritório Regional da Emater registrava perdas de 30% do total da área plantada no milho (grão); 30% também no leite; 15% entre bovinos de corte; 35% na safra da abóbora; e 25% na de feijão.

Segundo Maciel, os prejuízos devem se refletir na escassez de produtos, na consequente alta de preços e no volume de dinheiro que deixará de circular na região, especialmente nos setores de comércio e serviços. “O cenário é de empobrecimento”, lamenta. Entre os produtores a situação será delicada especialmente para os que não fizeram financiamento com seguro agrícola. “Para quem plantou por conta própria o prejuízo vai ser grande”, projeta.

Para reverter o quadro, Maciel torce por “boas chuvas” até o fim do ciclo da soja. “O ideal seriam 100 milímetros de chuva por mês até abril”, estima. No entanto, o gerente regional da Emater reconhece que não há essa garantia. Ele reclama principalmente das características da chuva da estação, de caráter irregular e mal distribuídas. “No mesmo município pode chover muito em uma localidade enquanto que em outra não cai um pingo”.

Cita como exemplo as chuvas de 12 e 13 de janeiro, quando foram registradas em média precipitações de 54,3 milímetros na região. Em São Lourenço do Sul, no entanto, choveu 230 milímetros – causando alagamento em trechos da BR 116.

A falta de chuva também já provocou atraso no plantio da soja. Em 13 mil hectares (2,5% da área total prevista na Zona Sul) as lavouras estavam começando a ser plantadas na semana compreendida entre 9 e 13 de janeiro porque não havia umidade no solo.

O que diz a meteorologia
A depender do que os modelos meteorológicos indicam, o cenário ideal projetado pelo gerente regional da Emater para reverter as perdas provocadas pela seca nas lavouras de soja não deve ser concretizado.

A meteorologista Estael Sias, da Metsul Meteorologia, diz que é aguardada uma frequência maior de chuva na Zona Sul entre o fim de janeiro e os primeiros 20 dias de fevereiro. No entanto, segundo ela, dentro dos padrões de chuva da estação: irregular e mal distribuída. “Pode chover cem milímetros em um dia por causa de um temporal e passar o resto do mês seco, o que não contribui para revigorar as lavouras de soja”, diz ela.

Para isso, conforme a meteorologista, seriam necessários de dois a três dias seguidos de precipitação, com um pequeno intervalo na sequência, e depois voltar a chover. Porém, não é o que está previsto. “Vai ajudar, melhor do que nada”, aponta.

Para março, segundo ela, é possível uma possibilidade maior de precipitação na Zona Sul, mas ainda dentro das características de verão – principalmente quanto à distribuição irregular. Já em abril, quando se encerra o ciclo da soja, os modelos climáticos indicam mês seco, com poucas chuvas.

“Nem vinha na lavoura”, diz produtor em Pelotas sobre o quadro de estiagem
Até as chuvas que caíram na região nos dias 12 e 13 de janeiro, o produtor de soja João Francisco Konzgen, de 55 anos, proprietário de uma lavoura de 290 hectares na Sanga Funda, Zona Norte de Pelotas, admite: evitava ir na plantação, que começou a cultivar para a safra deste ano no início de novembro do ano passado – serviço que exigia mais de dez horas de dedicação diárias.

Envolvido na produção de soja desde criança, o produtor
João Francisco Konzgen, de 55 anos, atua ao lado da família. (Foto: Adilson Cruz/JTR)

“Não tinha o que fazer, só ver as plantas morrendo. A chuva foi uma bênção, renovou, brotaram folhas novas, mas precisa mais, precisa de muito mais chuva”, disse ele. É exatamente o quadro da estiagem que tem lhe tirado o sono. “O resto vai fazendo, aplicando os produtos, mantendo”, explica.

Desde os 12 anos envolvido com lavoura de soja, Konzgen diz que já viveu várias situações – como períodos de seca, chuvas em excesso, planos de governos, boas políticas para produção, outras nem tanto. Nada, no entanto, parecido com os atuais custos de produção. E o que mais o assusta é o preço do diesel. Segundo ele, se há dois anos pagava até R$ 4 – valor que considera “possível” – os atuais R$ 5,87 estão “muito salgados”. “A produção agrícola é dependente do diesel, maquinário todo é à base de diesel, é o que faz a engrenagem andar”, critica.

Por esse motivo, Konzgen diz que se dá por satisfeito se em 2023 o preço da saca for fixado nos mesmos R$ 210 de 2022. Também não se decepcionaria se alcançar a mesma produtividade por hectare da safra passada, quando produziu 51 sacas (por hectare). Nesse ponto, no entanto, não depende dos mercados: mas do clima. “Tem que chover mais”, torce.

Em determinado período, Konzgen afirma que evitava ir na plantação, que começou a cultivar para a safra deste ano no início de novembro do ano passado. (Foto: Adilson Cruz/JTR)

Em resumo: “O que falta para nós, produtores, é aumentar o preço. O preço tá baixo, principalmente pelo custo. O custo da lavoura não pode ser mais que 40 sacos por hectare. Ideal é baixar o custo de produção, principalmente do diesel e do fertilizante, que quando comprei para esta safra, em julho, estava caríssimo”, disse.

Apesar das dificuldades, o produtor garante que não vai parar ou migrar para outro mercado. “Me criei fazendo isso, gosto. É o que eu gosto e sei fazer”, afirma.

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