O tempo não ajudou a safra 2022 da fruta mais representativa do agro pelotense – com 95% dela produzida no âmbito da agricultura familiar. Fatores climáticos devem derrubar a produção em Pelotas e região em até 40%, estimativa compartilhada entre produtores e técnicos da Emater.
No entanto, é certo: pêssego não vai faltar – nem na sua mesa, muito menos na indústria e tampouco nos dois eventos que celebram a importância da fruta na economia local. Afinal, mesmo com a quebra, a produção estimada é de 30 mil toneladas.
Não é pouca coisa. Por isso, vale o registro. A Quinzena do Pêssego, que este ano chega em sua 9ª edição, será lançada nesta sexta-feira (25), enquanto a Festa Municipal do Pêssego está marcada para 4 de dezembro, domingo, na Colônia Vila Nova, 7º Distrito, de Pelotas.
Tanto a Quinzena quanto a Festa, juntas, não têm o tamanho e a dimensão da Fenadoce. Mas assim como o doce artesanal, a fruta revela números que demonstram sua força, conferindo a Pelotas, segundo a Emater, a maior produção no estado. O pêssego está presente em três mil hectares na zona rural, com mais de 600 produtores. Abastece, tanto in natura como em conservas, todo o Rio Grande do Sul, além de Santa Catarina e Paraná, além de marcar presença em São Paulo, maior mercado do país. Além disso, a fruta beneficiada nas agroindústrias do município começa desde 2021 a ganhar o mercado externo, lugar até então cativo do pêssego argentino.
Motivos, apesar da quebra na produção, não faltam para celebrações. “Sempre tem o que festejar, o produtor tem que achar um motivo para sorrir”, diz o presidente da Associação Gaúcha dos Produtores de Pêssego (AGPP), Mauro Scheunemann, que também é produtor e registrou perdas nos pomares da sua propriedade.

Não importa. Ele sabe que o evento tem potencial para ir além da produtividade individual. “Não é possível ter centenas de produtores, produzir 30, 40 milhões de quilos, e não ter uma festa, uma janela para divulgar o que pode ser feito em termos não apenas da gastronomia, mas também conhecer essa cultura que é centenária em Pelotas e ter contato direto com o produtor. Sempre tem novidades, é um conjunto de coisas que agrega valor, todo mundo sai ganhando”, defende.
Extensionista da Emater, o engenheiro agrônomo Rodrigo Prestes reforça esse protagonismo: o município produz cultivares de dupla aptidão – tanto para a mesa (15% da produção) como para a indústria (85%). Com o auxílio da Embrapa em melhoramento, apresenta cultivares precoces, que começam a produzir em outubro, até outras bem tardias, para serem colhidas a partir de janeiro. “Isso garante uma vantagem para o produtor, que pode adequar a questão da mão de obra, e para a indústria, que mantém a capacidade instalada para receber essa quantidade de pêssego”, explica.
Umidade em excesso
Inverno com muitas horas de frio e pouca chuva é tudo que o produtor de pêssego precisa para celebrar no fim do ano uma boa colheita. Em 2022, no entanto, foi tudo que ele não teve. Excesso de umidade, baixa luminosidade devido aos poucos dias de sol, principalmente no florescimento, além do volume considerado alto de precipitação, confirmam o que produtores e os técnicos da Emater já vinham esperando: quebra na safra. “Tudo isso contribuiu, infelizmente”, lamenta Prestes, que trabalha com uma estimativa inicial de 30 a 40% de perdas em relação à safra anterior.
Gilmar Lüdtke foi um dos mais atingidos. O agricultor que produz pêssego em 10 hectares do total de 38 em sua propriedade na Colônia Francesa, interior do município, estima um prejuízo de R$ 100 mil. “Ano passado colhi 150 toneladas, neste ano se der 40 é muito”, lamenta. Segundo ele, não foi a primeira vez: “Há uns 20 anos, pouco mais, foi a mesma coisa”, lembra

A sorte, conforme o produtor, é que vem de duas boas safras – em 2020 também colheu 150 toneladas. Desistir é possibilidade que sequer cogita. “Estamos aí pra isso”, diz ele, que planta pêssego há 40 anos. “Vamos nos segurar no Proagro e seguir em frente”. O Proagro é o programa do governo federal que garante o pagamento de financiamentos rurais em caso de perdas decorrentes de eventos climáticos.
Lüdtke conta que não é o único a sofrer com a quebra da safra. “Aconteceu com todos que começaram cedo [fim de maio]”, lamenta. “Foi um inverno muito ruim, foram 21 dias seguidos de cerração, e o pessegueiro é sensível, puxa tudo que é doença pra dentro”, aponta.
Estiagem também contribuiu
Além da umidade e do excesso de chuvas, outros dois fatores também contribuíram: o primeiro foi o frio tardio do início de novembro. “Frio é benéfico no inverno. Primavera e verão tem que fazer calor”, reclama Scheunemann.

O outro ponto levantado pelo presidente da Associação foi a estiagem do último verão. “Onde a estiagem esteve mais forte, o problema é maior”, comenta ele, que projeta dez a 15 milhões de quilos a menos em 2022 em relação à safra passada.
No entanto, de acordo com Scheunemann, o fenômeno é regionalizado. Segundo ele, a seca foi mais intensa em algumas regiões da zona rural, o que fez com que algumas propriedades registrassem perdas menores.
Na sua, na colônia São Manoel, a queda foi de 20% em relação ao ano passado – uma redução não exatamente provocada pela adversidade climática, mas pela decisão de eliminar pomares que vinham registrando baixa produtividade, não compensando os custos de produção. “Foi um ano difícil para o produtor, se gastou muito para produzir – adubos e fertilizantes chegaram a custar R$ 300 reais o saco”, pontua.
Fruto de mesa
Uma das opções para ganhar mais um pouco tem sido a aposta no chamado fruto de mesa – in natura – mercado que conforme Scheunemann está aumentando. Por outro lado, exige mais do produtor em investimento e manejo. Isto porque trata-se de um setor que exige fruta boa, de “excelente” qualidade, tamanho e coloração. “Tem que encher os olhos”, resume. “Embora o custo de produção maior, é uma alternativa a mais – compensa”, destaca.