“O preconceito é a pior deficiência”. É com uma dessas placas que a Caminhada Down chamava a atenção por quem passava pelo Centro e Porto de Pelotas na manhã de quinta-feira (21). Com balões amarelos e muito samba, o Dia Internacional da Síndrome de Down fez parte da programação da Semana de Conscientização e Orientação sobre a Síndrome de Down de Pelotas, que seguirá até o próximo dia 28.
Organizada pela Associação de Pais de Down (Apadpel), segundo a presidente Luana Braga, o objetivo é de promover a inclusão e o fim do preconceito. “A inclusão não é só as pessoas com Down estarem dentro da escola, mas sim o ambiente estar adaptado para recebê-las”, ressalta.
“O tema desta semana foi a Transformação, simbolizado pela borboleta. Disponibilizamos debates, palestras e seminários. Se o outro quer entender e se transformar, ele vai nos procurar e vai vir atrás desta informação”, explica Luana.
Esta é a primeira semana depois do sancionamento da lei, em dezembro, que institui a Semana anualmente para o dia 21 a 28 de março. Porém, Luana explica que a Apadpel já promovia a semana para mobilizar o município. A programação completa você encontra na página do facebook da associação facebook.com/Apadpel.
“A Apadpel surgiu da reunião de quatro mães que aguardavam os atendimentos dos filhos no Centro de Reabilitação de Pelotas (Cerenepe) e a gente conversava sobre nossa rotina, sobre possíveis melhorias na vida dos nossos filhos e tentava compartilhar essa evolução com as demais pessoas com a alteração genética. Assim formamos o grupo Super Mães 21, que é um grupo no WhatsApp que reúne mais de 50 mães de Pelotas e região”, conta ela, acrescentando que “a partir daí começamos a fazer movimentos, algo para mostrar que as pessoas com Down estão aqui, que são capazes, que elas podem ser iguais a outras pessoas: podem estudar, trabalhar e fazer qualquer atividade”.
O Dia Internacional da Síndrome de Down faz parte do calendário oficial da Organização das Nações Unidas (ONU), sendo comemorado nos 193 países-membros. Conforme informações disponibilizadas pelo médico Drauzio Varella em seu site, a Síndrome de Down é uma alteração genética – e não uma doença – causada por erro na divisão celular. As pessoas apresentam características como olhos oblíquos, rosto arredondado e mãos menores.
Histórias para se inspirar
A história de Gabriel Nogueira pode ser considerada a primeira de muitas que Pelotas ainda quer vivenciar. Professor e graduado em Teatro pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), ele é a primeira pessoa com Síndrome de Down a se formar na instituição. “A minha maior motivação foi sempre estudar e ter vontade de ir além. E também me expressar comigo e com os outros, porque tem que saber trabalhar em equipe”, explica.
Sobre sua educação, Nogueira conta: “Eu sempre estudei em colégio regular. Estudei no Castro Alves até a quinta série, entrei no Colégio Pelotense na quinta série mesmo e fiz até o último ano do ensino médio. Esses colégios têm pessoas com Síndrome de Down e outras síndromes. A minha inserção nessas escolas foi muito boa com professores e colegas que são amigos por toda vida. Além disso, a minha adaptação no curso de teatro na UFPel também foi muito boa, sempre fazendo novos amigos”, comemora.
Gustavo Bicca também tem muito do que se orgulhar. O pelotense foi o primeiro a concluir um curso técnico – de Agroindústria no Campus Pelotas – Visconde da Graça (CAVG) – na América Latina. Sua mãe, a ginecologista Marilene Bicca relembra que, na época, o Ministério da Educação (MEC) veio a Pelotas acompanhar a cerimônia. Mas também compartilha a trajetória de batalhas. “A inserção para alfabetizar foi difícil. Aqui não tinha nada, teve muito sacrifício e exclusão. As escolas não tinham nenhum amparo para receber, ouvimos muitos nãos”, conta.
“Até que conseguimos numa escola particular e o colocamos no maternal, o alfabetizamos lá, porém alguns anos depois a escola encerrou as atividades. Meu mundo veio abaixo porque eu não conseguia colocar ele nas escolas. As pessoas nem retornavam as ligações para dar informação de matrícula”, diz.
Foi então que o problema achou uma solução. Depois de muita procura, Marilene encontrou na escola estadual Santa Rita a receptividade e inclusão que queria. “Há professores especiais para alunos especiais, não só como profissional, mas como gente”, destaca.
Passados alguns anos, Guga, como é carinhosamente chamado pela família e amigos, teve outra conquista. No final do ano passado, ele finalizou o curso de Jornalismo na Universidade Católica de Pelotas (UCPel), sendo também o primeiro com Síndrome de Down do curso na instituição.
Em entrevista, ele conta emocionado que sua vitória não foi sozinha. “Através da família toda, os amigos de fora, tive muitas pessoas que me apoiaram e me incentivaram a não desistir. Quando percebi que consegui, pensava: Tu conseguiu. Tu venceu mais uma batalha”, vibra.
Hoje, seu sonho é de unir sua experiência das fábricas na Agroindústria com a paixão pelos meios de comunicação. “Tive a prática dentro da fábrica e gostaria de misturar com o que aprendi no jornalismo: usar a TV para fazer as receitas, o jornal impresso para mostrar o modo de preparo e o rádio para divulgar. Gosto de todas as áreas”, finaliza.