Pelotas: Sete de Abril está a caminho da reinauguração

Processo integra restauração do Theatro, cuja reabertura está prevista para dezembro deste ano, quando completa 190 anos. (Foto: Michel Corvello)

Um dos mais importantes bens culturais de Pelotas, primeiro teatro construído no Rio Grande do Sul, pode não estar em uso – mas não está fechado. Fechado foi em 2010, numa ação do Ministério Público diante da situação precária em que o Sete de Abril se encontrava, o que o levou a uma obra de restauração no valor de R$ 6,4 milhões – recursos esses disponibilizados pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) destinados à edificação, construída entre 1831 e 1834.

Iniciada em agosto de 2019 e finalizada em 2022, a intervenção integral da edificação aparelha o Teatro de modernizações necessárias em tópicos como segurança, acessibilidade e climatização. “Não só pelo bem-estar do público”, diz o diretor do Teatro e ex-secretário de Cultura, Giorgio Ronna. “Mas para manutenção preventiva, para proteger da umidade e para se adequar às normas do Plano de Prevenção contra Incêndio (PPCI)”.

Antes de 2019, em 2013 e 2014, o Sete de Abril passou por obras na cobertura, executada com recursos da Superintendência Regional do Iphan com pequena contrapartida da prefeitura, num valor total de R$ 1,2 milhão. Ação necessária para cessar a infiltração, o que abria espaço para outras patologias, como mofo e cupins, e, assim, estancar a degradação. Paralelamente, em 2013, o teatro foi incluído no PAC Cidades Históricas, do governo federal.

Ainda no quesito segurança, a entrada de artistas e cenários, pelo calçadão da rua 15 de Novembro, está totalmente coberta. Conta também com reservatório de água que alimenta as mangueiras do plano contra incêndio, além de uma casa de máquinas. No novo projeto, já executado, o espaço serve como rota de fuga de artistas em caso de princípio de incêndio – há também uma saída para a plateia.

Mobiliário e caixa cênica são as pendências que ainda restam para reabertura definitiva da casa de espetáculos. (Foto: Gustavo Vara)

Nem o piso do palco escapa de ações de segurança. As madeiras de lei originais foram recuperadas e receberam tratamento antichamas – assim como todo o madeiramento. Ainda pelo PPCI, exaustores foram colocados sob as poltronas da plateia (ainda não instaladas) – outro artifício de prevenção em caso de sinistro. Na área do palco, uma estrutura metálica substituiu a antiga, em madeira, que se encontrava em estado precário. “Vai permitir que se tenha uma caixa cênica de primeira qualidade, dando segurança aos técnicos na troca de cenário e montagem de iluminação”, esclarece Ronna.

O projeto coube ao escritório Solé Associados, de Porto Alegre, com experiência comprovada em restauro de teatros históricos tombados pelo Iphan, como o São Pedro, em Porto Alegre, e o Teatro Nacional, de Brasília. A execução foi da construtora Biapó, de Goiânia (GO), também especializada em restauro de prédios e monumentos históricos.

Novas licitações
O Sete de Abril talvez já estivesse em funcionamento se no meio do caminho não houvesse instabilidade política. O compromisso com o Iphan era de que o órgão assumisse todos os custos da restauração, o que inclui climatização, mobiliário, caixa cênica e equipamentos de som e luz. Os recursos, segundo Ronna, estavam empenhados até dezembro de 2018. A partir de 2019, porém, as relações mudaram e não houve mais aporte do órgão para que se levasse adiante o restante do projeto.

A saída foi apelar à iniciativa privada. Ronna lembra que por iniciativa pessoal da prefeita Paula Mascarenhas (PSDB) foi viabilizado patrocínio de R$ 2 milhões com a CEEE Equatorial via Lei de Incentivo à Cultura (LIC). “Optamos por investir esse montante em duas frentes: mobiliário [poltronas, cadeiras de camarotes e da terceira galeria, além da bilheteria, orçado em R$ 1,2 milhão] e caixa cênica [cortina boca de cena, rotunda, sistema de varas de iluminação, cenário, entre outros itens, com orçamento de R$ 800 mil].” A licitação é aguardada para este mês.

Paralelamente, a Prefeitura já restabeleceu contato com a nova gestão do Iphan. Em março deste ano, Ronna e Paula foram a Brasília renegociar a pauta do Teatro Sete de Abril. Na volta a Pelotas, trouxeram na bagagem o alento de que a relação será retomada. “A perspectiva é superpositiva”, alegra-se. A prefeita e o diretor do Teatro tiveram agenda com o arquiteto pelotense Andrey Schlee, diretor do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização do órgão – para quem, segundo Ronna, a restauração do Teatro conta com todo apoio – afetivo inclusive.

Ótimo sinal. Para enfim ser reinaugurado, é preciso adquirir maquinário para finalizar o processo de climatização, atrelado ao PPCI – com o qual o Corpo de Bombeiros emite o alvará de funcionamento. É a terceira licitação que Ronna trabalha para ver lançada em 2023. “Toda a estrutura do sistema de climatização está instalada. O que precisa é comprar o maquinário que custa cerca de R$ 1 milhão. É abrir licitação, adquirir e instalar”.

Acessibilidade
O Teatro também vai ganhar uma plataforma de acesso a cadeirantes ao palco e ao primeiro nível dos camarotes. Esta, porém, não será a única estrutura que o espaço vai contar para permitir o ingresso de pessoas com essa deficiência. Ao lado da bilheteria será instalado elevador para acesso ao foyer e ao segundo andar de camarotes. A verba (R$ 150 mil) para licitação foi assegurada por meio do ex-deputado estadual Henrique Vianna (PSDB) – atual secretário estadual de Meio Ambiente e Infraestrutura.

Mobiliário e lustre
O mobiliário vai ser contemporâneo. As poltronas da plateia, adquiridas na restauração executada na primeira metade dos anos 1980, já não atendiam as normas atuais. A proposta dos novos assentos é da Solé Associados. Além de mais confortáveis, receberão tratamento acústico. Algumas unidades terão dimensão para abrigar obesos.

As divisórias dos camarotes passarão por novo revestimento e o lustre, restaurado por alunos do curso de Conservação e Restauro da UFPel, já tem até as lâmpadas adquiridas – no caso, pela Associação dos Amigos do Teatro Sete de Abril (Amasete).

Ronna anota outras duas aquisições – não fundamentais para reabrir o teatro, já que podem ser alugadas: equipamentos de som e luz, em custo estimado de R$ 1,5 milhão cada. Embora a alternativa, a possibilidade de contar com essa aparelhagem foi aberta na reunião com o Iphan. “Nâo é fundamental, mas é importante – com equipamento de sonorização a gente atende qualquer atividade artística” – justifica.

Na ativa
Mesmo sem PPCI, a direção do Sete de Abril busca formas de colocá-lo na rota da população. São promovidas visitas de escolas (foram mais de 20 desde o fim da fase aguda da pandemia), serviu para gravação de Avenida Angélica, último disco de Vitor Ramil, e tem sido requisitado para locação de videoclipes e eventos que não demandem público.

“As escolas são muito importantes para que essa geração entenda o valor do teatro e perceba que está sendo restaurado. A gente também quer que a comunidade veja isso, mais uma vez estará aberto no Dia do Patrimônio [19 e 20 de agosto] para um número controlado de visitas, o Sete está de fato totalmente restaurado, só precisa de mais investimentos para ser equipado”, diz Ronna.

Ele assinala que para além das visitações, há a parceria com o Sesc. Por meio dela já foram ofertadas quatro oficinas – duas remotas (dramaturgia de texto e dramaturgia de iluminação) e duas presenciais (circo contemporâneo e dança).

Na última edição do Festival do Sesc, entre 16 e 27 de janeiro, o Sete recebeu a Orquestra Jovem para ensaios. Participaram músicos de todo o Brasil e professores convidados, a maioria de outros países. “Foi uma experiência rica abrir o Teatro para músicos que não são de Pelotas, ouvimos muito a respeito da qualidade acústica do teatro, que sempre foi primorosa”, orgulha-se Ronna.

O piano de cauda Essenfelder, de 1947, recuperado voluntariamente pelo afinador e restaurador pelotense Rogério Resende, que em Brasília (DF) mantém a Casa do Piano, pode tornar-se um instrumento para utilização do Teatro como equipamento cultural – como de fato é.

Estão alinhavadas parcerias com o Centro de Artes da UFPel para aulas no palco do Sete de Abril, nas quais os alunos da Música poderão usar o piano – seguindo orientação de Rogério Resende para questões de afinação. Também há convite no mesmo sentido para as turmas dos cursos de Dança e Teatro.

Para quando
O diretor do Teatro é reticente quando provocado a arriscar datas de reinauguração. Admite que trabalha na perspectiva de reabrir o Sete até o fim do ano, mas evita criar esperanças. Trâmites burocráticos indicam prudência. “Pode uma licitação ser impugnada ou nenhuma empresa aparecer [licitação vazia], o que nos obriga a abrir um outro processo licitatório, tudo isso leva tempo e promove atraso. Em outros momentos falei em datas, mas se tudo rodar direitinho não é impossível reinaugurar o teatro até o fim do ano”, projeta.

Propostas para marcar a reabertura estão à mesa. Já se discute uma programação diária de dez a 14 dias, gratuita, que valorize as diferentes cenas culturais da cidade, com protagonismo aos artistas pelotenses ou que vivem em Pelotas.

Após, é integrar o Teatro à cidade. “A ideia é que o teatro esteja conectado com todos os bairros e com a zona rural.” Para isso, prevê trabalhar muito com a rede pública. Primeiro com os estudantes, depois com os produtos culturais destes territórios.

“Não entendo o Sete como casa de espetáculos. O Sete de Abril já foi espaço de produção de conhecimento, profissionalização, oferta de oficinas de atuação, dramaturgia, direção, iluminação. Vamos ter núcleos ativos, parceria de dramaturgia com o Sesc e pretendemos fomentar a criação de espetáculos artísticos”, compromete-se.

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