
A 10ª edição da Abertura da Colheita do Milho, realizada no dia 10 de fevereiro na Fazenda São Francisco, propriedade rural de 3.6 mil hectares localizada no 2º subdistrito de Jaguarão, escancarou a porteira para consolidar na Zona Sul do Estado a ideia de que o milho irrigado ganhará protagonismo no agronegócio regional. Não por acaso, a área de terras baixas, rica em mananciais, já é vista pelo mercado, por pesquisadores e produtores como a nova fronteira agrícola do grão no Brasil. Também não é acaso o fato de que o evento após nove edições ocorreu em uma propriedade rural na Metade Sul, em particular na Zona Sul do Rio Grande do Sul. O futuro é aqui?
Alicerçado no presente, o futuro é, de fato, promissor. O produtor rural e presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Gedeão Pereira, lembrou em sua fala no evento que o grão hoje ocupa o segundo lugar no pódio das commodities do agronegócio brasileiro – atrás apenas da soja.
Disse mais: “Tenho quase convicção de que a cultura do milho vai superar a cultura da soja nos próximos dez, 15 anos. A Rússia e a China estão fazendo com o milho o mesmo que fizeram com a soja.” Nessa mesma toada, o presidente da Farsul foi além. Para ele, a introdução do milho irrigado em larga escala em terras baixas pode mostrar que uma “revolução possível” está em curso na Metade Sul. “São 200 sacos de milho por hectare em uma safra de grãos que enfrenta seca pelo terceiro ano seguido”, afirmou.
Pesquisa
Homenageado na 10ª Abertura da Colheita do Milho o pesquisador da Embrapa José Maria Parfit, não tem dúvidas: “Esta fronteira agrícola que está se abrindo em terras baixas pode abastecer e exportar milho para outros estados e outros países. É um momento importante na região, sem dúvida”, afirma ele, que há mais de 40 anos na Embrapa se debruça sobre a questão de manejo do solo e da água no sistema de produção de terras baixas no Sul do Brasil.

Parfit anota ainda que o Rio Grande do Sul é demandante de milho para a indústria e para a produção primária de aves, suínos, gado de leite e de corte, ao mesmo tempo em que está longe de ser autossuficiente na produção do grão. O estudioso vê na fronteira agrícola que se abre justamente na região de terras baixas um grande potencial para o Estado retomar o status de produtor de milho – condição que perdeu para outras unidades da federação – e ainda agregar valor, atraindo plantas da indústria alimentícia que demandam pelo grão. “A região tem água. Tendo água vai poder irrigar. Podemos plantar 500 mil hectares de milho na Zona Sul”, projeta.
Além da água, o pesquisador assegura que a região dispõe também de tecnologia. Destaca a irrigação por meio do sulco camalhão, que a Embrapa desenvolve desde 2017, a mesma utilizada na Fazenda São Francisco, do produtor Renato Teixeira Gomes da Silva (Grupo Quero-Quero), onde a produtividade alcançou 200 sacos de milho por hectare em meio a um quadro de forte estiagem pelo terceiro ano seguido. “É um sistema de irrigação e drenagem muito econômico, barato, que estabiliza a produção em níveis altos. O produtor sabe que vai plantar e colher bem.”
E por falar no produtor, Parfit admite que “ganhou dinheiro” quem apostou no milho irrigado nesta safra. Motivo a mais para defender o aumento da produção do grão na região. “O preço está bom e uma produtividade de 200 sacos por hectare representa sete, oito mil reais por hectare. É um bom negócio. Milho agrega valor na região, diferentemente da soja. Soja colhe e vai embora. O milho transforma, alimenta o gado, a ave, contribui na produção do leite. É incomparável”, elogia.
O chefe geral da Embrapa Pelotas, Roberto Pedroso, também defende a introdução de milho irrigado em larga escala nos, segundo ele, quatro milhões de hectares de terras baixas na região: “Estamos diante da grande oportunidade de desenvolvimento da Metade Sul, apesar das estiagens.”
“Metade Sul é o novo horizonte”, elogia presidente da Apromilho
O presidente da Associação dos Produtores de Milho do Rio Grande do Sul (Apromilho), Ricardo Meneghetti, é outro que aposta suas fichas no papel que a Metade Sul passará a ter, em especial a região das terras baixas, na produção do milho irrigado. “Colher milho no extremo Sul do Estado é um sonho realizado, um conjunto de tecnologia, profissionalismo e dedicação, é uma fronteira a desbravar”, afirmou.
Segundo Meneghetti, a competência da região na produção de grãos vai converter a Zona Sul em um apoio para que o Rio Grande do Sul, em um primeiro momento, possa suprir a demanda e num segundo fazer a exportação do produto. “Com apoio da Embrapa, Emater e armazenagem de grãos, temos a certeza que a Metade Sul é o novo horizonte”, elogiou.
No evento, governador fala em ampliar programas de irrigação
“Não tem dinheiro sobrando, mas é possível alocar recursos para expandir programas de irrigação no território gaúcho.” A declaração foi feita pelo governador Eduardo Leite (PSDB) durante a 10ª Abertura da Colheita do Milho na Fazenda São Francisco, em Jaguarão, também no dia 10 de fevereiro.
Leite garantiu que há capacidade financeira para esse investimento, a fim de permitir reserva d’água e expandir e ampliar a rede de energia em áreas rurais para fazer a distribuição dessa água onde é necessária a implementação de pivôs. “Custa dinheiro, mas essa capacidade de investimento a gente volta a ter”, afirmou.
O governador abordou também a necessidade de conciliação nas normas ambientais para fazer a devida reservação. Lembrou que o Estado já alterou a regulação nas normativas para esse fim, expandindo a possibilidade de construção de açudes para até 25 hectares com licenciamento ambiental municipal. “Tem impacto ambiental, mas o poder público não pode trancar, negar, precisa analisar com eficiência a característica de cada uma das intervenções e encaminhar diretrizes”, disse.
Segundo o chefe do Executivo gaúcho, o desafio é crescer com respeito ao meio ambiente, permitindo o crescimento econômico. “Todos perdem se tivermos visão estreita em cada uma das áreas de atuação na nossa sociedade. Respeito ao meio ambiente não pode ser um obstáculo a quem quer empreender.”
Sobre a fronteira agrícola que se abre na região com o milho irrigado, Leite classificou a edição da Abertura da Colheita do Milho em Jaguarão como um “dia histórico”. “Mesmo com a estiagem, celebramos aqui a capacidade de superação e resiliência de quem empreende apesar das limitações que o clima impõe. Celebramos a capacidade empreendedora, a ciência e a pesquisa”, festejou.