A realidade das mulheres canguçuenses em um táxi se assemelha com a dos demais motoristas homens. O diferencial é a percepção delas em relação ao contato entre condutor e passageiro, já que muitas carregam um histórico de desafios em relação ao gênero e cargas horárias que acabam sendo um pouco mais extensas do que as masculinas.
Normalmente uma cidade calma, sem grandiosos acontecimentos, o dia a dia do trânsito em Canguçu não guarda muitos mistérios. As taxistas geralmente trabalham em seus pontos fixos aguardando os passageiros durante o período comercial dos dias úteis e para quem atende 24 horas, em suas casas atentas a possíveis chamados.
De acordo com uma pesquisa sobre o perfil dos taxistas no país, realizada em 2016 pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT), apenas 2,7% dos condutores brasileiros são mulheres.
Essa realidade vem sendo alterada ao longo dos anos também em razão do aumento na possibilidade de denunciar desvios de conduta que venham a ocorrer durante as viagens.
Em cidades maiores, existem até mesmo aplicativos ou grupos de corridas destinados exclusivamente para condutoras, possibilidade que por enquanto não chegou em todo país, continuando assim a existir esse contato direto entre quem precisa de uma locomoção e quem garante esse serviço.
Trabalho social e maternidade
Diná Leal, aos 54 anos, atua como taxista em um ponto ao lado da Prefeitura Municipal e conta um pouco sobre a surpresa do começo de sua carreira. “Nem eu sabia que ia gostar tanto quando comecei, porque eu dirigia só o básico na cidade, mas eu gosto muito do contato com as pessoas, ajudar e fazer novas amizades”, diz.
Ela trabalha há oito anos no ramo e garante que vive satisfeita por sempre conseguir conciliar horários com projetos pessoais, além de conhecer novas pessoas e nunca ter tido grandes problemas em sua trajetória.
A insegurança sempre foi uma preocupação de qualquer motorista, especialmente para as mulheres, afinal de contas nunca se sabe quem vai entrar no carro. Mas a vida delas ao volante não é feita só de desafios, por vezes acabam criando uma relação de companheirismo e amizade com os passageiros.
Diná conta uma situação específica em que foi realizar uma corrida e a passageira estava com as crianças menores, dois meninos gêmeos e uma filha de seis anos que relatou estar precisando de auxílio financeiro. Conhecendo a história através do táxi e por fazer parte de um grupo de ação social de sua igreja – em que realizam doações e brechós para arrecadar dinheiro em prol da compra de alimentos às famílias em vulnerabilidade social – ela ofereceu ajuda a essa mãe.
“O contato com o povo é bom. A gente vira amiga, irmã, psicóloga. Às vezes as pessoas entram no táxi e acabam desabafando. É muito bom poder ajudar quem precisa”, destaca.
Conciliar as atividades do lar e o táxi nunca foi um desafio para Darleni Schröder Zarnot, que aos 44 anos relata suas vivências durante 12 anos de profissão. Ela e o marido começaram a exercer o ramo a partir do surgimento de um ponto de táxi que ficou vago próximo à Loja Pompéia. O marido, Edson, trabalhava numa empresa e ela passou a conduzir o táxi sozinha, alternando em alguns momentos, principalmente quando teve o primeiro filho, Erick, que tem 11 anos. Tudo corria bem, mas se viu impedida de continuar sua carreira pela necessidade de cuidar do filho menor, Diogo, que com um ano e dois meses foi diagnosticado com uma doença rara e precisou de diversos cuidados médicos e procedimentos diários de fisioterapia.
Desde o começo, Darleni prezou por atender bem às demandas dos passageiros, contando com clientes fixos, carregava mercadorias de todos os tipos, auxiliando os passageiros nas corridas para o interior, carregando e descarregando produtos pesados, sem nunca ter sofrido nenhum tipo de desrespeito ou situação constrangedora.
Além de contar sua história, deixou um agradecimento para toda comunidade pelo apoio que entre todos os municípios da Região Sul realizaram diversas campanhas de arrecadação de recursos em prol da aquisição do valor destinado ao tratamento de seu filho menor.
O mercado de transporte de passageiros em Canguçu abriu as portas para mulheres que queriam trabalhar, sendo através dele a luta contra barreiras diárias do trânsito do município que é bastante criticada pela falta de fiscalização. Como qualquer profissão, essas mulheres encontraram obstáculos, mas em nenhum momento deixaram de atuar no município pelo fato de serem mulheres, segundo o que contam, se quer foram apontadas com estereótipos de gênero.
As mulheres não trabalham na cidade somente no ramo de táxis, sendo profissionais de outras áreas que vão desde condutoras de carretas – lidam com transporte rodoviário e cargas pesadas – até professoras do Centro de Formação de Condutores de Canguçu (CFC).
Ser mulher e dirigir profissionalmente é um duplo desafio, mas que está sendo desbravado, conquistando espaço que não era sequer imaginável até um século atrás. Para o futuro, conforme lembra Diná, “seguir trabalhando, tendo esperança que tudo vai passar (pandemia) e tudo vai voltar ao normal”, finaliza.