
“Era educado, gentil, amigo de todos, adorava futebol. Gente boa, sabe? Um apaixonado por estudar aqui, tanto que, em seu funeral, a mãe dele me disse: ‘ele amava tanto o colégio que a mochila já estava pronta, apenas esperando o reinício das aulas’. Será uma homenagem simples, mas de coração para lembrá-lo. Esquecê-lo, jamais”.
Essa foi a resposta da diretora Graziele Garcia à pergunta do JTR sobre como era conviver com Luan Couto da Silva, de 13 anos, que será homenageado pelas turmas que compõem o Ensino Fundamental da Escola Municipal de Ensino Fundamental Vieira da Cunha, no 5º Distrito, em Piratini.
Obviamente, tanto a gestora quanto os professores, funcionários e alunos gostariam que, na retomada do ano letivo, no dia 17, Luan também estivesse presente não em homenagem, mas entre os demais estudantes. Infelizmente, isso não será possível, restando a todos o luto, sentimento que tomou a comunidade escolar, bem como a saudade e a tristeza que será, de forma coletiva, externada no ato póstumo realizado no pátio do educandário situado às margens da ERS-702. Neste ano, Luan cursaria o 9º ano.
A reportagem conversou com a irmã do estudante, Jaine Couto, de 23 anos, sobre a perda precoce do jovem. Jaine enviou uma foto que tirou de Luan junto a uma viatura da Polícia Rodoviária Federal (PRF) na Fenadoce, em Pelotas, sendo este o registro preferido do goleiro nos jogos realizados durante o recreio na escola.
“Era meu tudo! Um menino carinhoso, alegre e apaixonado por futebol, e que adorava jogar bola com os amigos. Sinto que, junto com ele, eu também me fui! Estou tentando seguir por minhas irmãs, que são pequenas, e por meus pais, ambos muito abalados. É isso que meu irmão gostaria que eu fizesse, já que estava sempre preocupado com todos a sua volta. Ele entrou naquele hospital com vida, saudável e, infelizmente, saiu de lá sem nada”, lamentou a jovem.
Luan esteve internado no Hospital de Caridade de Canguçu (HCC), onde passou por procedimento cirúrgico no dia 24 de janeiro, vindo a óbito no dia 27, o que levou, inclusive, sua família a registrar um boletim de ocorrência na Polícia Civil.
Ainda atônito com o ocorrido, à frente das decisões relacionadas às providências, Gilson Couto, 25 anos, um dos seis irmãos da vítima, contou à reportagem, que o desfecho trágico deixou inúmeros questionamentos para a família. “Estive junto de meu irmão, no quarto, enquanto ele aguardava a entrada no bloco cirúrgico. Exceto o problema no saco escrotal que, sim, precisava de correção para que, no futuro, não se tornasse um câncer, era um garoto saudável. A nós foi passado ser um procedimento simples e rápido. E foi: não durou 40 minutos. Mas, a seguir, na sala de recuperação, ele teve uma parada respiratória, que foi revertida, mas responsável por levá-lo à UTI”, resumiu o supervisor em telecomunicações.
Couto afirma que, mesmo o irmão tendo sido mantido sedado, todas as informações repassadas pela equipe médica da UTI do hospital eram positivas, o que aumentou ainda mais a incompreensão de todos. “Sinais normais, exames também, entre eles de sangue, o neurológico e dos pulmões. Todas as informações acerca da sedação, que seria retirada na segunda-feira, nos permitiam ter certeza de que ele ficaria bem”, recordou o familiar.
Segundo o irmão, já na segunda-feira, minutos antes de subirem de andar para ver o menino, o médico foi até a família e informou que Luan havia sofrido uma parada cardíaca e, mesmo com 45 minutos de tentativas da equipe médica, não houve a reversão do quadro.
“O que leva um paciente a estar bem e, daqui a pouco, morto? Não entendemos nada!”.
A exclamação pode explicar a decisão tomada mesmo diante da dor: “convenci nossos pais a autorizarem a realização da necropsia no corpo dele. O laudo do Instituto Médico-Legal dirá se foi o destino, ou, quem sabe, falha humana”.
Couto tomou todo o cuidado com as palavras a fim de evitar o que se tornou comum nas redes socias, onde se julga e condena em segundos, o que pode, a partir do imediatismo e nunca depois da análise sentenciar e destruir a vida, principalmente, de um profissional.
“No calor da hora, da tristeza e da indignação, às vezes podemos falar bobagens e incriminar alguém inocente. Queremos acreditar que, infelizmente, foi apenas o destino agindo. Ao mesmo tempo, não podemos permitir que, daqui a pouco, um erro médico possa ter sido decisivo, afinal, até as mãos mais experientes erram e, se isso aconteceu, certamente, quem errou precisa ser responsabilizado”, observou.
O supervisor em telecomunicações acrescentou outra informação para qual também requer explicações. “Me disseram, ainda, que meu irmão aspirou a alimentação ingerida através da sonda e esses alimentos foram para os pulmões. Mas em que posição ele estava ou deveria estar quando foi alimentado? Qual era o grau de elevação da cama durante e posterior a isso? Havia alguém atento neste sentido?”, questionou. “Para não passarmos o resto de nossas vidas nos perguntando o que pode ter acontecido, tivemos que ir além. Nos restando aguardar a posição do IML, na esperança de que esta responda todas as nossas perguntas, tire nossas dúvidas”.
O JTR buscou a posição da gestão do hospital, bem como a de Fábio Brião, que há mais de 20 anos atua como anestesista, tendo atuado na cirurgia de Luan. Demonstrando incompreensão, mas, principalmente, tristeza com o desfecho inesperado de algo simples, a correção de um testículo retrátil, Brião optou por não se manifestar neste momento.
Já Benhur Jacondino, que está à frente do comando do hospital, afirmou ser precipitado emitir qualquer posição quanto ao caso, que começará a ser analisado nesta quarta-feira (5) pelos três membros da Comissão de Sindicância. “Além do parecer da Comissão, é imprescindível aguardar a conclusão dos peritos do IML. Quanto às oitivas que integram os procedimentos internos, estas começarão somente neste dia 5. Então, não há nada em que possamos colaborar, ao menos agora. Seria precoce”, salientou o gestor do HCC.