Da janela do apartamento no oitavo andar, Cesar e seu genro contemplam o movimento da rua, aguardando a volta de sua esposa e filha do shopping.
Subitamente vários carros do Bope chegam velozes e param na frente do prédio. Rapidamente cercam o prédio da floricultura em frente com toucas ninja e metralhadoras em punho.
Em seguida, saem com um rapaz pardo e esguio, rendido sob a mira das armas e desaparecem num piscar de olhos.
Ato continuo, elas chegam com as faces lívidas e as vozes embargadas e perguntam:
– Vocês viram o que aconteceu na floricultura?
– Vimos, mas não entendemos.
Contaram. Então. a seguinte história:
“Entramos despreocupadas na floricultura pra comprar uns gerânios e plantar na sacada. Falamos para a atendente:
– Viemos escolher umas plantas!
Alguém ao lado agarrou firmemente o braço de Cintia.
– Aqui ninguém vai comprar nada!
– Que é isso cara tá me estranhando, respondeu Cintia puxando o braço.
– Não vê que é um assalto, disse ele, pressionando a pistola contra suas costelas.
Olhamos ao redor e, como num filme em pause, percebemos oito mulheres e uma criança de colo rendidas pelo assaltante. Nossa entrada colocou em suspenso momentaneamente o assalto. Do outro lado do balcão o segundo comparsa agitava uma pistola e gritava
– Me dá o dinheiro, todo mundo, e os celulares também!
Enquanto isso, esvaziava furiosamente a caixa registradora.
Eu passei disfarçadamente a bolsa para as costas enquanto Cintia, lentamente, colocou o celular no bolso de trás da calça.
– Eu vi um celular, cadê o celular, me passa o celular!
Fizemos ouvidos moucos e o assalto seguiu em frente. Quando recolheram tudo que queriam e achamos que terminara, um dos assaltantes vai embora pela porta da frente e o outro, ninguém entendeu o porquê, fica tomando conta dos 10 reféns. Se nota que está nervoso e não sabe o que fazer.
– Todo mundo em fila, vamo pra casa dos fundos, rápido, rápido!
Seguimos em séquito passando entre bromélias e alfazemas até chegar à sala da casa.
– Todo mundo deitado no chão, agora!
Todo mundo obedeceu, dava para ouvir os joelhos batendo no piso de madeira. Eu escondia minha bolsa, às vezes na frente, às vezes atrás, de acordo com o movimento do assaltante.
Ninguém se atrevia a levantar os olhos, mas dava pra ver a pistola trepidando nas mãos nervosas do assaltante. Havia um berço no quarto. Aproveitei e me enfiei o mais que pude embaixo dele. A criança de colo começou a chorar alto e todos nós ficamos angustiadas temendo o pior.
– Faz essa criança calar a boca agora, ou……
Não sei como, mas a criança se acalmou. Foi então que bateram na porta e se ouviu:
– Aqui é a polícia, cê tá cercado, se rende e entrega a arma!
No mesmo instante, ele pega pelos cabelos uma das reféns e encosta a arma na sua cabeça.
– Tenho reféns, cês não vão me pega!
Todo mundo se encolheu mais ainda prevendo o tiroteio que viria. Foi então que se ouviu de uma das reféns uma voz clara e serena:
– Se rende moço, senão eles vão te matar!
E o moço escutou a voz do bom senso e se rendeu. A seguir, coturnos e mais coturnos passaram por cima de nós. Comecei a sair de gatinhas em direção à porta, quando senti um puxão na minha roupa:
– Senhora, pode levantar, o assalto terminou, tá tudo seguro!
Na saída pensei, não vou perder a viagem e me dirigi a dona da floricultura:
– Moça, posso escolher minhas plantinhas agora?
A mulher trêmula e lívida, mas mais que tudo espantada respondeu:
– Senhora, agora não é uma boa hora, pode ser amanhã, por favor?”
O jardineiro, que de longe tudo via, foi quem chamou a polícia.
Gerânios e pistolas são uma associação não só improvável, como também impensável. Todavia, em algum lugar aconteceu, ou não…
Ciro J. Mombach
Médico