Tenho minha versão preferida do Hino do Rio Grande do Sul, aquela que vinha estampada no livro de exercícios de caligrafia, usado nas escolas gaúchas, no início do século passado.
As crianças treinavam suas escritas cursivas redigindo “foi o Vento de Setembro o precursor da liberdade”.
Além de me parecer mais bonito e poético, como todo sul-riograndense, sei que setembro é mês daqueles ventos que varrem as cerrações e as umidades invernosas do agosto.
Antes dessas tintas especiais modernas, era o mês em que se começava as pinturas das casas, especialmente as fachadas.
As podas nas árvores, arbustos e parreiras já teriam terminado – sempre feitas em meses que não tem “R” (maio, junho, julho, agosto) – aí iniciavam as pinturas, recomendações que cruzaram os tempos.
Mas havia outras indicações fortes para aquele “vento precursor da liberdade”.
Foi em setembro, no dia 20 (1835), que os combatentes farroupilhas conquistaram Porto Alegre. Quase um ano depois, foi num 11 de setembro (1836) que os mesmos farrapos declararam o Rio Grande do Sul um país independente, nascendo no mesmo mês nossa República.
É evidente que a existência de quatro ou cinco versões do mesmo hino era algo inaceitável e julgo ter feito bem nosso governador, Flores da Cunha, ao nomear um grupo de notáveis – quando se preparavam as atividades do centenário da Revolução de 35 – para que unificassem as versões e chegassem a um único hino oficial para uso nas festividades. Lei mesmo, só bem mais tarde, no governo Meneghetti.
Esse 20 acabou prevalecendo sobre o onze e sobre o vento, creio eu, por razões estratégicas. Não esqueçamos que também foi num 20 de setembro (1870) que houve a tomada de Roma e concluiu-se o processo de unificação italiana.
Cantar o Vinte de Setembro, por certo, mobilizaria (e mobilizou) gaúchos antigos e os oriundos da Itália, cantando a mesma data coincidente.
A versão do hino “pegou” e para orgulho nosso é cantada aos quatro ventos.
Inclusive naqueles que retornam em setembro, os quais, independentemente de leis, continuarão soprando, trazendo as sementes e as esperanças que acompanham as primaveras.
*José Henrique Medeiros Pires é Licenciado em Estudos Sociais pelo ICH UFPel, Especialista em Políticas Públicas pela Universidade de Salamanca, Espanha e jornalista e radialista