Em tempos de isolamento social ou dias chuvosos bate uma nostalgia gostosa das lembranças e saudades dos tempos de criança lá no campo. Lembro-me dos amigos de infância e da vontade que tínhamos em brincar, tempos sem redes sociais, em que divertido era correr, entrar na chuva para se molhar e se atirar de carrinho nas poças d’água depois do chuvisqueiro. O risco era chegar em casa quase a noitinha, cansado de tanto gastar energias e receber um dolorido puxão de orelhas pela roupa molhada e embarrada.
Será que valeu à pena? Tenho certeza que sim. As crianças lá do campo certamente eram bem felizes, porque tinham a natureza e a inocência como aliados e seus pais eram rigorosos na educação dos filhos. Eu, particularmente, nunca apanhei, pois era do grupo dos mais comportados ou daqueles que sabiam fazer a arte na hora certa, tipo “sorrateiro”, no bom sentido. Nem todos tinham a mesma sorte, a disciplinadora varinha de marmelo, com frequência riscava as pernas dos “calças curtas”.
Mesmo que todas as crianças sejam imaginativas, algumas poucas brincadeiras eram parecidas com aquelas da gurizada da cidade, talvez o jogo de bola, com uma diferença: os atletas do meio rural jogavam com os pés descalços, o tal de tênis era artigo de luxo. Subir em árvores e tomar banho de açude foram minhas artes preferidas, mesmo quando as pernas ficavam tapadas de sanguessugas e tinha que arrancar com os dedos uma por uma.
Para quem não sabe, a sanguessuga é um anelídeo, animal hermafrodita, que possui ventosas e se alimentam geralmente de sangue. No Rio Grande do Sul, os guris do campo chamam de “chamichungas”.
Bah… mas isso era saudável. Mas claro, no meio rural existe um universo imaginativo para as crianças explorarem o faz-de-conta e tudo que existe na natureza possui seu fundamento, aprendi que para qualquer enfermidade ou machucado dos arteiros, ali mesmo nos campos, rios e florestas existe o tratamento adequado, mesmo a grudenta “chamichunga” é utilizada pela gente da cidade, nos tratamentos medicinais, estéticos e terapêuticos.
O mundo mudou e atualmente até as crianças estão se esquecendo das brincadeiras e aderindo a modernidade das novas tecnologias. Necessário, pois os tempos são outros e a informação/comunicação precisa ser democratizada. Há algum tempo, entrevistando alguns pais do meio rural, que nem e-mail possuem ou conhecem, todos relataram que os filhos estão conectados nas principais redes sociais.
Será que os meninos do campo estão virando marionetes das tecnologias? Não acredito… são outros tempos, a própria tecnologia pode ser aliada e “contar” com mais recursos, o quanto era encantador ser criança lá no campo.